O Boletim #6 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No décimo texto “Formas dos trabalhadores enfrentarem a atual realidade brasileira”, o graduando em Ciências Sociais Lucas Alencar apresenta uma análise da atual conjuntura brasileira, mais especificamente da realidade dos trabalhadores brasileiros.

Confira o texto abaixo!

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Formas dos trabalhadores enfrentarem a atual realidade brasileira
Lucas Alencar [94]

Resumo O presente texto é parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral 2022 e tem por objetivo fazer uma análise da atual conjuntura brasileira, mais especificamente da realidade dos trabalhadores brasileiros. Para isso, neste sexto boletim, pretendemos analisar o atual quadro político e econômico, buscando entender a realidade dos trabalhadores e, principalmente, observar se e como esse grupo tem se organizado e se posicionado frente à conjuntura atual. Para tal estudo, foram analisadas matérias publicadas em sites jornalísticos, como Carta Capital, Brasil de Fato, A Verdade, entre outros.

Um pouco do Brasil de hoje

A realidade brasileira nunca foi muito favorável àqueles que a sustentam e produzem: trabalhadores e trabalhadoras nas suas mais variadas especializações, realidades e configurações. A vivência da classe trabalhadora é marcada por fatores como desigualdade, pobreza, fome, violência e demais fatores opressores. Apesar disso, também é um grupo caracterizado pela luta, resistência e organização, por aqueles que buscam sobreviver em meio à exploração, resistindo; e por outros que continuamente enriquecem, crescem e exploram.

Brasil, agosto de 2022, e para qualquer lado que olhemos vemos crise. Crise econômica, crise de segurança, crise ambiental etc. Não há uma só causa ou justificativa que possa explicar o porquê das coisas estarem como estão, entretanto, dois pontos que podem nos auxiliar a entender esse quadro são o desemprego e a precarização.

O Brasil já vem apresentando altas taxas de desemprego por um longo período de tempo, com as últimas pesquisas apontando para índices de 9,3%[95] neste trimestre, números esses que podem num primeiro momento parecer bons, tendo em vista uma diminuição gradativa nos índices, contudo, essa diminuição se deu principalmente devido ao aumento na taxa de informalidade. A precariedade é patente: 40% dos trabalhadores brasileiros atuam na informalidade[96], sem nenhum direito trabalhista, como férias, 13º salário, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) ou benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a exemplo do auxílio-doença, salário maternidade, seguro-desemprego etc.

Desempregados e precarizados, a fome também voltou a se fazer presente no dia a dia dos trabalhadores. A cada dez famílias, seis enfrentam dificuldades para comer. Mais de 125 milhões de brasileiros não têm comida garantida todos os dias, além dos 33,1 milhões que estão passando fome[97]. A própria cesta básica, conjunto formado por produtos utilizados por uma família durante um mês, em julho deste ano chegou a ultrapassar o valor do salário mínimo[98].

Ou seja, milhões de trabalhadores passam fome ou vivem em insegurança alimentar. Sem ter onde trabalhar, muitos encontram na informalidade uma forma de conseguir alguma renda para sua família. Enquanto isso, mesmo aqueles que ainda possuem renda, conseguem adquirir cada vez menos bens e serviços devido ao seu poder de compra corroído pelos altos custos de vida. É uma verdadeira catástrofe humanitária. Ainda assim, diferentes segmentos de trabalhadores buscam na união e na colaboração formas de sobreviver.

O que os trabalhadores estão fazendo para enfrentar a atual realidade

Se engana quem possa vir a pensar que a população, os trabalhadores e suas famílias submetem-se a essa realidade de forma simples, submissa, não buscando quaisquer que sejam as formas de mudar a sua realidade. Por mais que o Brasil de hoje coloque tantos na informalidade, no trabalho precarizado, na pobreza e na fome, ainda existem ferramentas que os trabalhadores têm à sua disposição, mobilizadas na busca por “sobrevivência”, e a principal delas é a mobilização, a organização de sua classe.

Ao olharmos para o Brasil de hoje não faltam exemplos de mobilização, de organização trabalhadora, de homens e mulheres que de diferentes formas e de diferentes categorias se unem na busca de uma melhor qualidade de vida. Quando falamos de organização, algumas categorias “clássicas” de trabalhadores vêm à mente mais facilmente, como trabalhadores rurais sem terra e metalúrgicos, mas também cada vez mais vemos a mobilização de novas categorias, como a de motoristas e entregadores de aplicativo. Através de alguns exemplos, pretendemos mostrar como esses trabalhadores vêm lidando com a atual realidade de crise brasileira, como vêm se mobilizando e como isso se relaciona diretamente e retroalimenta esse contexto de crise.

Dentre os trabalhadores “clássicos”, aqueles que fazem parte de categorias mais estruturadas e antigas, é possível citar os sem terra e os sem teto, respectivamente, os integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST). Por mais que estes possam não parecer tão presentes em números e influência nas grandes cidades, sua organização e mobilização já vem de muitos anos, podendo ser caracterizados pelo seu longo trabalho de base para com os seus pares, como por exemplo a construção em conjunto dos comitês populares por todo o país.. Sua longa história porém não faz com que a organização[99] destes fique defasada[100] no presente, com a categoria se fazendo presente[101] ano a ano, se mobilizando[102] em busca de suas reivindicações, um excelente exemplo disso é uma iniciativa de. Tendo em vista nosso atual contexto de crise, é coerente ver como muitos trabalhadores encontram nessas organizações, apoio e alento na procura de direitos.

Em contrapartida, uma categoria de trabalhadores que cada vez vem aumentando mais, assim como também vem aos poucos se organizando e mobilizando, é a dos trabalhadores de aplicativos, motoristas e entregadores de aplicativos. Esses trabalhadores especificamente tem sido a ponta de lança da precarização nas grandes cidades.

Símbolo da precarização de nosso tempo, os trabalhadores de aplicativos são uma das categorias que mais sofrem com a chamada uberização, esta que aumenta a informalidade e faz o trabalhador perder garantias previstas por lei e arcar com todos os riscos da atividade profissional para  ganhar o mínimo para sua sobrevivência. Categoria relativamente nova, estes entregadores ganharam notoriedade e foco públicos principalmente em 2020, quando organizaram uma greve nacional103 que chegou a mobilizar milhares de trabalhadores da categoria em todo o Brasil, greves essas onde entregadores protestavam contra as condições abusivas impostas pelos aplicativos. Os entregadores pediam melhores taxas, fim dos bloqueios e mais equipamentos de proteção contra o coronavírus.

Por mais que esse momento tenha se destacado, a luta desses trabalhadores não se originou nem cessou ali. Daquele ano em diante, paradas, mobilizações[104], protestos[105] e greves marcaram a realidade da categoria. Dentre as lideranças e organizadores dessa categoria, se destaca Paulo Lima, também conhecido como Galo de Luta, uma das lideranças do movimento dos entregadores antifascistas, trabalhador que devido a seu papel de organizador e de liderança, chegou a ser alvo de propagandas contrárias ao movimento dos trabalhadores, advindas do próprio aplicativo empregador. Essa figura, essa liderança, serve para evidenciar a forma orgânica com que lideranças trabalhadoras surgem, como a realidade faz com que esses indivíduos busquem se unir e defender seus interesses.

Conclusão

Portanto, fica evidente que cada vez mais nos encontramos em uma realidade de crise, em um contexto onde se mobilizar e organizar muitas vezes acaba por ser a única forma de buscar por seus direitos, por melhores condições de vida. A precarização, o desemprego e a fome caracterizam a realidade do trabalhador. Quanto mais radical forem as condições de vida, mais radicais serão as tentativas de sobreviverem a elas; greves[106] já são uma realidade dentre diversas categoria[107], e tendem a ser cada vez mais[108].Um dos muitos exemplos dessa mobilização é a iniciativa de jovens entregadores de organizarem um sindicato da categoria.

Não só parcelas mais precarizadas de trabalhadores se encontram mobilizados, diversos outros grupos também o fazem, como autônomos e funcionários da iniciativa privada e público[109]. Essa mobilização, junto com a realidade que cada vez mais precariza os indivíduos, acaba por fortalecer ainda mais esse ciclo de organização e conscientização. Uma parcela de trabalhadores se mobiliza, luta por um objetivo e mesmo que em parte o alcança, assim mostrando a outros trabalhadores o que têm a ganhar buscando o mesmo, o que tem a ganhar também se mobilizando e organizando. Em um quadro onde uma experiência de organização trabalhadora fortalece a posterior, seja com seus erros ou acertos.

Somente no futuro conheceremos o desenrolar de nossa conjuntura. Mas, olhando para o passado recente e para os fatos do presente, é difícil ver no futuro algo diferente de cada vez mais precarização e perda de direitos, seguidas de luta e mobilização por parte dos diretamente afetados por isso, lutando e resistindo, em busca de manter, de resguardar sua própria existência.


[94] Lucas Alencar é aluno do 8º período de Ciências Sociais na UFRJ e pesquisador do OPEL e do EduPolítica.

[95] https://g1.globo.com/economia/noticia/2022/07/29/desemprego-recua-para-93percent-em-junho-diz-ibge.ghtml

[96] https://www.cut.org.br/noticias/40-dos-trabalhadores-sao-informais-no-brasil-no-norte-sao-mais-de-50-e3d9

[97] https://averdade.org.br/2022/07/33-milhoes-de-brasileiros-passam-fome-todos-os-dias/

[98] https://www.cartacapital.com.br/sociedade/trabalhadores-da-eletrobras-entram-em-greve-por-tempo-indeterminado/

[99] https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/09/4951204-manifestantes-do-mtst-ocupam-bolsa-de-valores-em-sao-paulo.html

[100] https://mst.org.br/2022/08/08/o-mst-e-resultado-de-um-amplo-e-permanente-trabalho-de-base-afirma-rosana-fernandes/

[101] https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2022/08/5031058-movimento-dos-trabalhadores-sem-teto-protesta-em-frente-a-sedes.html

[102] https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2021/09/4952582-mtst-protesta-em-frente-a-casa-de-flavio-bolsonaro-no-lago-sul.html

[103] https://averdade.org.br/2020/07/greve-nacional-entregadores/

[104] https://www.infomoney.com.br/minhas-financas/motoristas-e-entregadores-de-uber-99-e-ifood-fazem-paralisacao-nesta-terca/

[105] https://www.redebrasilatual.com.br/trabalho/2022/03/trabalhadores-do-ifood-uber-e-99-fazem-greves-unificadas-por-melhores-condicoes-de-trabalho/

[106] https://www.brasildefatodf.com.br/2022/07/28/ponto-de-apoio-ao-trabalhador-mostra-unidade-de-classe-e-evidencia-estado-ineficiente

[107] https://www.brasildefatopr.com.br/2022/07/14/brasil-teve-721-greves-em-2021-aponta-dieese

[108] https://www.brasildefato.com.br/2022/07/14/jovens-entregadores-querem-organizar-sindicato-para-a-categoria-em-marica-rj

[109] https://averdade.org.br/2022/06/trabalhadores-do-transporte-publico-realizam-greve-em-sao-paulo/

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