O Boletim #1 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No décimo primeiro texto “Empresários, liberais, Bolsonaro e recentes tendências de apoio eleitoral”, o bolsista Lucas Alencar analisa a relação que Bolsonaro estabeleceu ao longo do seu mandato com a agenda de interesses empresarial e liberal, articulando
essa análise aos impactos na vida de trabalhadores.

Confira o texto abaixo!

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Empresários, liberais, Bolsonaro e recentes tendências de apoio eleitoral
Lucas Alencar

Resumo O presente texto faz parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral 2022 e tem por objetivo analisar a relação que Bolsonaro estabeleceu ao longo do seu mandato com a agenda de interesses empresarial e liberal, articulando essa análise aos impactos na vida de trabalhadores.

Evidencia-se que Bolsonaro, apesar de eleger-se em 2018 comprometido com uma agenda liberal, falha em manter o apoio desse segmento. Este texto mostra porque Bolsonaro está perdendo apoio do grupo político que buscou favorecer, assim como porque mantém baixo apoio entre trabalhadores desempregados.

Nossa hipótese é que Bolsonaro, apesar de conseguir aplicar parte de sua agenda neoliberal, não foi bem-sucedido em alcançar os efeitos desejados. Muito pelo contrário, provocou índices econômicos insatisfatórios e piora da qualidade de vida dos trabalhadores. Ainda assim, Bolsonaro tem a preferência de 56% dos eleitores empresários, enquanto Lula conta com 23%, de acordo com pesquisa Datafolha. A partir da análise da situação de Bolsonaro nesse campo, mostramos como o empresariado tem se movimentado no tabuleiro eleitoral, registrando as recentes manifestações de alguns deles em relação às candidaturas de Luís Inácio da Silva e Simone Tebet.

Para tal estudo foram analisadas matérias publicadas em sites jornalísticos como Exame, G1, El País, Folha de São Paulo, Veja, Nexo Jornal, Estadão, O Globo, entre outros.

O espaço da agenda liberal e a perda gradativa de apoio empresarial

No campanha eleitoral em 2018, Jair Bolsonaro ganha visibilidade entre setores empresariais [87], sinalizando apoio à agenda de interesse do mercado, como privatizações, reformas administrativas, redução de carga tributária, reforma previdenciária, ajuste fiscal, reestrutura do serviço público, entre outras medidas88 vocalizadas por entidades empresariais – Confederação Nacional da Indústria (CNI), Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomércio SP), Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) e outras.

Tendo o economista Paulo Guedes como seu fiador, Bolsonaro forja aliança com setores liberais que, resistentes ao retorno do Partido dos Trabalhadores à presidência, aderem à candidatura conservadora nos costumes e pró-mercado na economia. Durante a campanha, Bolsonaro reforçou uma imagem de “defensor do patrão”, enfatizando a dificuldade de empreender no Brasil, defendendo a retirada de direitos trabalhistas para manutenção de emprego [89] e absorvendo as fórmulas liberais para a retomada do crescimento econômico e da geração de empregos.

Já no governo, Bolsonaro tem dificuldades na articulação política para aprovação de suas propostas e medidas no congresso nacional [90]. Com a distribuição de emendas parlamentares [91], compromete-se com o chamado “centrão”, o que lhe conferiu maior governabilidade e lhe permitiu aprovação da reforma da previdência, sem, contudo, conseguir avançar na realização da agenda da base empresarial e liberal. Em agosto de 2020, o governo havia se desfeito de mais de 80 empresas estatais, quando liberais auxiliares de Guedes “debandam” do governo, insatisfeitos com a lentidão de reformas e agenda de privatização, preservadas ainda Eletrobras, Correios, Banco do Brasil e Petrobras [92]. Medidas que aumentam a presença do Estado na economia, como o programa Pro-Brasil, patrocinado pelos militares, e a flexibilização do teto de gastos, afastaram os liberais.

Ao longo do mandato, os flertes do presidente com o autoritarismo93 também minaram parte da base de apoio do empresariado brasileiro, ao menos para aqueles que, trocando em miúdos, entendem instabilidade política como sinônimo de instabilidade econômica – o que não é bom para os negócios [94]. As várias denúncias de corrupção no governo, o naufrágio da candidatura de Moro e, os ataques frequentes de Bolsonaro à institucionalidade, categorizados inicialmente apenas como cortinas de fumaça [95], aproximam, a poucos meses das eleições, empresários de outros candidatos. Sobre esses ataques, há gente do mercado que teme ainda um “autoritário sem golpe” na presidência, ou seja, nacionalista e inibidor de reformas liberais [96]. Pode-se ler, aí, tanto Bolsonaro ou Lula.

Os impactos na vida dos trabalhadores

Na crise de saúde gerada pela pandemia de coronavírus, as declarações de Bolsonaro como “economia não podem parar por causa do novo coronavírus” [97] marcaram a opinião pública. Em uma tentativa de priorizar a economia, Bolsonaro ignorou especialistas e recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), seguindo uma deriva negacionista, em detrimento da preservação da vida dos trabalhadores. Mergulhado numa crise econômica, as consequências de suas decisões são hoje cada vez mais evidentes: não a economia do país foi preservada, nem a saúde e a vida da população [98].

As medidas de fomento à geração de postos de trabalho foram insuficientes e o Brasil continua com altos índices de desemprego – estudos projetam taxa de 13,7% para 2022, um dos piores índices no mundo [99], e economistas do mercado financeiro calculam que a taxa seguirá na casa dos dois dígitos até 2025, completando 10 anos consecutivos nessa faixa [100]. Destaca-se a perda de renda familiar, a queda nos índices de consumo [101] e a alta constante de juros. O índice de 12,13% de inflação acumulada nos últimos doze meses (maio 2021 a abril 2022) é a pior escalada desde 2003 [102] . Além do desemprego, observa-se a precarização do trabalho e a perda do poder de compra daqueles que ainda conseguem ter uma fonte de renda[103].

Se a classe empresarial foi negativamente afetada pelas decisões de Bolsonaro, a classe trabalhadora foi ainda mais impactada, em sua posição de maior vulnerabilidade [104], tanto pelos índices econômicos, como a alta dos preços dos alimentos, como pelo pouco efetivo combate à pandemia. A reforma trabalhista do período Temer e a agenda liberal parcialmente aplicada pelo atual governo, apesar de supostamente terem como objetivo a melhoria na qualidade de vida dos cidadãos, tem como frutos o oposto [105].

O quadro de desalento, desemprego, subemprego e precarização está relacionado ao fenômeno da chamada uberização do trabalho. Trabalhadores se sujeitam à informalidade e a condições de trabalho cada vez mais precárias, em busca de uma qualidade de vida cada vez menor. Além de apatia ou indignação, a situação de precarização produz também novos tipos de organização de trabalhadores. O movimento dos entregadores antifascistas protagonizaram greves em 2021 e 2022, denunciando as pautas neoliberais e perda de direitos trabalhistas. “A uberização vem para suprimir direitos” [106], declara Paulo Lima, o Galo, um dos expoentes desse recente movimento de trabalhadores.

Posicionamentos recentes de empresários

Notamos, portanto, que as dificuldades de Jair Bolsonaro em satisfazer o segmento empresarial e liberal, define cada vez mais a linha que separa esse segmento do núcleo duro do bolsonarismo. A empresária Rosangela Lyra, ex-chefe da Dior no Brasil, ilustra a parcela do empresariado que se afasta de Bolsonaro e manifesta apoio a Lula em nome da democracia. Tendo militado no movimento Vem Pra Rua e feito campanha pela Lava Jato, aposta na derrota de Bolsonaro pela chapa Lula-Alckmin. Apoiadora do PSDB, está na expectativa quanto ao papel do ex-tucano Geraldo Alckmin na chapa, até então desencantada com as possibilidades de uma terceira via ganhar expressão. Fundadora do Instituto Política Viva, Lyra é administradora de grupos com mais de 10 mil contatos no Whatsapp.

A campanha de Lula e Alckmin vem se aproximando do empresariado. Nos últimos meses, figuras do Partido dos Trabalhadores como Gleisi Hoffmman, em companhia do ex-presidente do Banco Fator, Gabriel Galípolo, e o ex-ministro Guido Mantega reuniram-se em pelo menos duas ocasiões com empresariado organizado pelo Grupo Esfera, preconizando conciliação e apoio ao crescimento da classe produtiva [107] . Empresários presentes – como Abílio Diniz – refutam que a alta das taxas de desemprego, de juros e da inflação, assim como a queda no poder de compra, seja de responsabilidade de Bolsonaro, como argumenta Hoffmman. A posição do partido de defesa da autonomia do país em relação ao petróleo foi o maior ponto de discordância.

Mantega defendeu [108] um programa de investimentos liderado pelo Estado como dinamizador, a necessidade de uma reforma tributária negociada, criticou com ineficiente o teto de gastos a ser substituído por alguma outra âncora fiscal que permita investimentos. Segundo ele, Lula fará um governo de centro, sem radicalismos. Após as reuniões com o grupo Esfera, o PT informou que os economistas Pérsio Arida e André Lara Resende, que fizeram parte da gestão de Fernando Henrique Cardoso (FHC), atuarão como formuladores do plano econômico da chapa Lula-Alckmin[109].

Lula tem declarado na campanha que, em seu governo, “os empresários vão ganhar mais dinheiro” e os trabalhadores “vão ganhar mais salário” [110] . Se diz contra as privatizações de Eletrobras, Correios, Banco do Brasil e Petrobras [111] . Critica a reforma trabalhista, a qual qualifica como escravocrata, mas não se compromete com uma “revogação” da reforma, como defendida pelas Centrais Sindicais, PT, PC do B e PV, e, sim, com uma contrarreforma, que considere a situação atual do mundo do trabalho e os avanços tecnológicos [112].

A recente definição pelo nome de Simone Tebet (MDB), com apoio do PSDB e Cidadania, como o nome da chamada terceira via, vem atraindo um grupo de empresários. Nomes como Teresa Bracher, mulher de Candido Bracher, expresidente do Itaú Unibanco e Fábio Barbosa, sócio da Gávea Investimentos, estão ao lado de outros executivos e empresários se articulando para impulsionar a candidatura [113]. A economista Elena Landau, ex-diretora do setor de privatizações do BNDES no governo Fernando Henrique Cardoso e atualmente ligada ao movimento Livres, está na coordenação do programa de governo de Tebet. A candidatura atrai também apoio do economista Armínio Fraga, dos ex-presidentes do BNDES Andrea Calabi e Maria Silva Bastos Marques e do ex-presidente da Petrobras Philippe Reichstul, o presidente do conselho de administração da Klabin, Wolff Klabin.

Vale ainda ressaltar que uma parcela significativa do setor empresarial continua apoiando Bolsonaro, seja por motivos ideológicos e não somente econômicos, seja por confiar que a agenda liberal será retomada num eventual segundo mandato, com privatizações e reformas. Em 2018, nomes do empresariado do varejo manifestaram apoio nada discreto a Bolsonaro (Havan, Coco Bambu etc) [114]. Neste ano, o núcleo duro de empresários apoiadores ainda está em definição. Neste maio, um ato destinado a obter recursos para a campanha reuniu ruralistas, empresários e garimpeiros, entre eles, Fernando de Castro Marques, dono do laboratório União Química e lobista da vacina russa Sputnik [115]. Bolsonaro prometeu, em fins de maio, recriar o ministério da Indústria [116] extinguido por Guedes, atendendo a empresários que reclamam da visão financista dos economistas liberais do governo e preocupam-se com a redução das alíquotas de importação que tendem a favorecer a desindustrialização do país.

A despeito da insatisfação de parte do empresariado, a mais recente pesquisa do Datafolha divulgada em 27 de maio mostra que Bolsonaro tem a preferência de 56% dos eleitores empresários, enquanto Lula conta com 23%. Em contrapartida, 57% dos eleitores desempregados declaram voto em Lula, enquanto 16% preferem Bolsonaro [117]. Isso sugere que, a despeito dos índices econômicos, boa parte do empresariado saiu ganhando com as medidas do atual governo, enquanto os trabalhadores trabalham cada vez mais, para receber cada vez menos.


[87]  https://bit.ly/3z5IItl

[88] http://glo.bo/3wXXqzY

[89] https://valor.globo.com/politica/noticia/2018/12/04/bolsonaro-trabalhador-tera-de-escolher-entre-mais-direitos-ou-emprego.ghtml

[90] https://bit.ly/3aiAnZ2

[91] http://glo.bo/3lXkRVb

[92] https://www.youtube.com/watch?v=IgZoPBJYHH4

[93] https://bit.ly/3MSVz6p

[94] https://bit.ly/3aviA11

[95] https://bit.ly/3zbdEc1

[96] https://bit.ly/3LUdgBb

[97] https://bit.ly/3lRKUgo

[98] http://glo.bo/3m062kt

[99] https://g1.globo.com/economia/noticia/2022/04/28/taxa-de-desemprego-do-brasil-deve-ficar-entre-as-maiores-do-mundo-em-2022-veja-ranking.ghtml

[100] https://bit.ly/3lXlwpD

[101] https://bit.ly/3MXr8fi

[102] https://www.nexojornal.com.br/expresso/2022/05/11/Quais-recordes-a-infla%C3%A7%C3%A3o-brasileira-j%C3%A1-quebrou-em-2022#:~:text=A%20infla%C3%A7%C3%A3o%20teve%20nova%20alta,um%20momento%20de%20renda%20baixa

[103] https://bit.ly/3z9IrFU

[104] https://bit.ly/3LUdB6V

[105] https://www.brasildefato.com.br/2022/04/27/artigo-o-fracasso-da-reforma-trabalhista%5B10

[106] https://bit.ly/3aviSF9

[107] https://esferabrasil.com.br/blog/post/gleisi-mostra-esforco-do-pt-em-compor-com-o-empresariado-nacional

[108] https://esferabrasil.com.br/blog/post/em-almoco-mantega-faz-acenos-ao-setor-privado-e-defende-investimentos

[109] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/eleicoes/2022/noticia/2022/05/23/pt-confirma-conversa-com-economista-persio-arida-ex-gestao-fhc-para-elaborar-plano-economico-de-chapa-lula-alckmin.ghtml

[110] https://www.cartacapital.com.br/politica/empresarios-vao-ganhar-mais-dinheiro-e-voces-vao-ganhar-mais-salario-e-educacao-diz-lula-em-mg2/

[111] https://www.cnnbrasil.com.br/politica/lula-vamos-brigar-para-evitar-privatizacao-da-eletrobras-correios-e-banco-do-brasil/

[112] https://www.cnnbrasil.com.br/politica/lula-compara-reforma-trabalhista-a-tratamento-do-tempo-da-escravidao/

[113] https://exame.com/brasil/empresarios-e-economistas-articulam-acoes-para-impulsionar-simone-tebet/

[114] https://exame.com/negocios/os-empresarios-que-apoiam-bolsonaro/

[115] https://www.estadao.com.br/politica/bolsonaro-encontra-com-investigados-e-lobistas-em-evento-de-arrecadacao-para-campanha/

[116] https://exame.com/brasil/bolsonaro-recriar-ministerio-da-industria-extinguido-por-guedes/

[117] https://oglobo.globo.com/politica/eleicoes-2022/noticia/2022/05/pesquisa-datafolha-veja-os-desempenhos-de-lula-e-bolsonaro-por-segmentos-do-eleitorado.ghtml

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