O Boletim #1 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No sétimo texto “Candidaturas Negras: a questão racial nas eleições de 2018 e as perspectivas para 2022” (p. 35-39), a bolsista Laryssa Miranda examina como a questão racial atravessa as relações políticas na sociedade brasileira.

O estudo discorre sobre o papel do racismo estrutural nas relações políticas estabelecidas em 2018 e a funcionalidade dos mecanismos criados para a sua superação as eleições de 2022.

Confira o texto abaixo!

_____
Candidaturas negras: a questão racial nas eleições de 2018 e as perspectivas para 2022
Laryssa S. C. Miranda

Resumo O presente texto é parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral 2022 e tem por objetivo fazer um levantamento das candidaturas negras nas eleições de 2018, além de entender como a pauta está se apresentando para o pleito de 2022.

Para isso, neste primeiro número, buscou-se examinar como a questão racial atravessa as relações políticas na sociedade brasileira a partir de uma análise qualitativa dos cruzamentos cor/raça dos candidatos e eleitos nas eleições de 2018 em todo território nacional.

Este artigo discorrerá sobre o papel do racismo estrutural nas relações políticas estabelecidas em 2018 e a funcionalidade dos mecanismos criados para a sua superação nas eleições de 2022. Nossa hipótese é a de que, em virtude do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) destinado aos candidatos negros, ocorrerá um aumento exponencial dessas candidaturas no pleito de 2022. O segundo ponto faz referência a uma possível escalada da violência política nas próximas eleições que, segundo os dados, tendem a vitimar políticos negros.

Para tal estudo, foram analisadas matérias postadas em sites jornalísticos, tais como: Grupo o Globo, El País, Folha de São Paulo, Uol e Terra. Além de sites como o do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), SaferNet e o do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE).

Apresentação

As eleições de 2018 trouxeram uma série de fenômenos ainda não vivenciados pela sociedade brasileira, pode-se afirmar que a onda bolsonarista foi o principal expoente da efervescência política que inundou as 5 regiões do país, o avanço apenas não alcançou a região norte e nordeste. A polaridade entre esquerda e direita foi aprofundada, relações sociais rompidas e violências – físicas e verbais – engendradas. Essas agressões foram direcionadas aos candidatos, parlamentares e eleitores integrantes da oposição, um dos casos de maior repercussão vitimou Romualdo Rosário da Costa, o Mestre Moa do Katendê, homem negro assassinado por declarar voto no candidato à presidência Fernando Haddad (PT).

A ascensão da extrema direita e do conflito entre figuras antagônicas corroborou para a criação de um ambiente hostil principalmente na internet com ataques direcionados a representantes engajados em agendas alinhadas às “pautas identitárias”, com destaque a racial. Só em outubro de 2018 houve um considerável aumento nos índices de denúncia por racismo, sendo respectivamente o Facebook, Twitter e Instagram as páginas mais denunciadas.

Democracia representativa: sub-representação preta na política

Entre 2012 e 2019 houve um aumento de 36% dos autodeclarados pretos e 10% dos pardos, a população branca sofreu uma queda de 3% em 8 anos. Mesmo com a alta nas autodeclarações, dos 1.752 eleitos, 71,97% são brancos; pardos totalizam 23,57%, enquanto pretos somam 4,22%. Segundo o quantitativo apresentado pelo TSE, negros representam 46,56% das candidaturas enquanto brancos somam 52,4%.

Essa desigualdade se aprofunda quando observado o quantitativo de negros eleitos, principalmente para os cargos de governança e presidência. Nenhuma candidatura negra chegou ao segundo turno das eleições para presidente, o cargo foi disputado entre dois candidatos brancos. Somando 25% entre os eleitos, negros foram minoria na corrida eleitoral de 2018 para ocupar o cargo de governador: das 131 candidaturas brancas 9 foram eleitas em contraste com 3 eleitos que se autodeclaram pardos. Há uma tímida diversidade entre os senadores, no entanto, 75% dos eleitos são brancos e 25% negros.

A sub-representação da população preta está fortemente ligada às condições desiguais que se apresentam nas competições eleitorais. Historicamente esses atores têm menos acesso a partidos maiores, também são insuficientemente veiculados, visto que não usufruem dos mesmos recursos de campanha e tempo de televisão.

Em agosto de 2020, por 6 votos a 1, foi decidido pelo Tribunal Superior Eleitoral que a divisão de fundo eleitoral e do tempo de TV deveria ser proporcional ao total de candidatos. A medida tem como intuito mitigar as disparidades raciais entre brancos e negros arraigadas na sociedade brasileira. A decisão foi tomada tendo como base a análise de consulta formulada pela deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), tal ação gerou resultados tangíveis: pela primeira vez na história os negros (pretos e pardos) superaram o número de brancos em candidaturas. O resultado dessa ação se deu com 48,04% de candidaturas brancas, enquanto as negras totalizaram 50,02%.

Violência Política e Questão Racial

Em setembro de 2018 foram registradas 2.758 denúncias de racismo, em outubro deste mesmo ano esse número sofreu uma alta de 17.177 denúncias, como pontua o SaferNet Brasil. Essas agressões foram direcionadas tanto aos parlamentares quanto aos eleitores. Os episódios de agressão não se limitaram às eleições de 2018, segundo a pesquisa “Violência Política contra Mulheres Negras” realizada pelo Instituto Marielle Franco em parceria com as organizações Justiça Global e Terra de Direitos, mais de 70% das mulheres negras que assumiram compromisso com a Agenda Marielle e disputaram as eleições municipais de 2020 foram atingidas pela violência política. Quase 80% das agressões são virtuais, 20,7% são comentários racistas em redes sociais e em 29,3% das vezes partem de candidatos militantes de partidos adversários.

A execução da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) sintetiza a violência que marcou as eleições de 2018. Uma mulher, negra, LGBTQIA+, defensora dos direitos humanos, assassinada junto ao motorista Anderson Gomes ao sair de uma palestra sobre a necessidade de ampliar a participação de jovens negras na política.

Dados do Observatório da Violência Política e Eleitoral, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), mostram um aumento de 48% nos casos de violência política no primeiro trimestre de 2022 em comparação com o último trimestre de 2019. No que diz respeito ao perfil social das vítimas, 43,3% são negros. Conclui-se que mesmo com a baixa representação, a política se mostra como um campo violento para pessoas pretas e pardas.

Considerações Finais

Entende-se que para que a democracia se consolide é essencial que os campos políticos sejam fidedignos a composição social na qual representam, rompendo com limitações e promovendo uma maior liberdade de escolha para o eleitorado. Entretanto, como evidenciado na pesquisa, mesmo constituindo a maior parte da população brasileira, pretos e pardos ainda são minorias em cargos de tomada de decisão, o que reflete uma falha por parte das instituições brasileiras em retratar a realidade nacional nos espaços da política institucional. Nas eleições de 2018 negros foram minoria tanto entre os candidatos quanto entre os eleitos, essa discrepância se acentua quando analisada a disputa para presidente e governador.

Apesar da baixa presença de parlamentares negros, curiosamente esses são as principais vítimas da violência política. Violência pode ser entendida como um instrumento que visa atingir um objetivo específico, em certos casos almeja implementar ou preservar um poder por meio da força, seja essa física ou simbólica, legítima ou ilegítima. Aqui especificamente a agressão é direcionada a um grupo que historicamente foi excluído das disputas políticas, voltada a uma minoria que imprime esforços para marcar uma posição na política institucional a fim de ter suas vozes ouvidas e demandas atendidas.

É importante pontuar que a ascensão do negro no campo político representa inevitavelmente uma redução significativa do número de parlamentares brancos, a violência e sub-representação preta na política institucional aqui descrita caracteriza os esforços de um grupo pela manutenção dos seus privilégios.

O panorama geral das próximas eleições apresenta um quadro preocupante com o considerável aumento dos casos de violência e intensificação da polaridade política já existente, essa configuração representa uma ameaça a segurança dos atores inseridos nos ambientes políticos e concomitantemente ao corpo eleitoral com posicionamento bem definido.

As eleições de 2022 inclinam-se a uma maior diversidade em virtude da aplicação da FEFC. No entanto o número de fraudes nas autodeclarações tende a aumentar, pois políticos que não se viam enquanto negros passaram a se autodeclarar racialmente desta maneira, à vista do bolo financeiro que pode ser maior para candidaturas negras. Para frear tal problemática, é esperado que os parlamentares criem mecanismos de verificação e transparência nas autodeclarações.

Deixe um Comentário





3 + 13 =