O Boletim #8 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No nono texto “Agronegócio e trabalhadores rurais na política eleitoral”, o graduando em Ciências Sociais Lucas Alencar apresenta uma breve análise da relação entre empresários do agronegócio e trabalhadores do campo.

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Agronegócio e trabalhadores rurais na política eleitoral
Lucas Alencar [102]

Resumo O presente texto é parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral de 2022 e tem por objetivo trazer uma breve análise da relação entre empresários do agronegócio e trabalhadores do campo. Buscar entender como estes diferentes grupos sociais vêm se relacionando com os atuais presidenciáveis, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Messias Bolsonaro (PL). Para isso, neste boletim, pretendemos analisar quais as figuras, grupos ou organizações se destacam no processo eleitoral, tanto do lado dos trabalhadores quanto do lado do empresariado. Para por fim, elencamos alguns pontos a serem acompanhados no futuro. Para tal estudo foram analisadas matérias publicadas em sites jornalísticos como Brasil de Fato, O Globo, CartaCapital, BBC e o site do MST, entre outros.

A realidade rural brasileira

Quando temos em foco a realidade rural, alguns temas vêm à tona devido à sua importância e, se não levados em conta, acabariam por alterar e distorcer completamente a compreensão dessa realidade. São eles: o alto índice de concentração de terras no país[103], consequência da ausência de uma reforma agrária ampla e popular; o grande poder político e econômico que os grandes proprietários de terras possuem; os diversos e permanentes conflitos que ocorrem no campo, sejam esses entre grandes proprietários, entre fazendeiros e pequenos proprietários, entre agricultores ou populações indígenas; e, por fim, a atuação do Estado frente a essas questões.

O cenário é marcado principalmente pelo conflito, pela luta e pela organização social. Há uma dicotomia. De um lado, empresários e latifundiários do campo aproveitam seu poder político e econômico para produzir benefícios próprios[104], seja por meio de violência física contra pequenos agricultores[105], seja por meio de invasões de terras[106] ou influência direta na política institucional[107]. Do outro lado, a organização política da classe trabalhadora, único meio de defesa e luta. E nessa organização, destacam-se os diferentes movimentos sociais do campo, como a Comissão Pastoral da Terra, o Movimento dos Pequenos Agricultores, o Movimento Sem Terra, entre outros.

É um erro olhar para a realidade camponesa de nosso país e ver dois lados equiparáveis, marcando apenas pequenas diferenças. A realidade nos mostra exatamente o oposto disso. No Brasil, apenas 1% dos proprietários de terra controlam quase 50% da área rural do país[108], proprietários esses que usam seu poder e influência para acumular mais riquezas, que lucram com uma estrutura que se baseia na exploração, tanto da terra quanto daqueles que nela vivem[109]. Na medida em que geram recordes de desmatamento[110] e de lucros, parte significativa da população brasileira se encontra à mercê da fome[111]. Os trabalhadores do campo sofrem com essa opressão e buscam da forma que podem se organizar, sobreviver e lutar contra isso. O principal exemplo dessa organização é o MST, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, atualmente composto por 450 mil famílias assentadas e cerca de 90 mil famílias acampadas, organizadas em 24 estados brasileiros[112]. Apesar de todas as adversidades, o movimento consegue ser o maior produtor de arroz orgânico do país[113].

Agronegócio e trabalhadores sem-terra na política institucional

Devido à sua influência política e econômica, os grandes empresários do campo tem grande capacidade de pautar o debate na política nacional, o que se faz evidente no período de eleição. A atenção que o setor do agronegócio recebe dos atuais presidenciáveis – Lula e Bolsonaro – é de se destacar. Desde 2018, Bolsonaro já tinha no agronegócio um de seus principais grupos de apoio e sinalizava que estava disposto a flexibilizar normas, derrubar vetos e o que fosse necessário para favorecê-los. Como consequência da atuação de seu governo nos últimos 4 anos, não é de se surpreender que Bolsonaro continuasse tendo apoio de parcela significativa desse setor[114]. O período é marcado, principalmente, pelo aparelhamento e sucateamento de órgãos de fiscalização[115] ambiental como o Incra[116], por exemplo, tendo o ex-ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, sido investigado em esquemas de corrupção[117], além da disparada dos índices de violência no campo[118][119]. Por outro lado, setores do agronegócio se articulam com Lula e apoiadores[120], o que demonstra a importância desse setor no ambiente eleitoral.

A bancada do agro é uma evidência desse poder[121]. No cálculo da Frente Parlamentar de Agropecuária (FPA), ela passa a reunir o número expressivo de 158 deputados federais, no mínimo, a partir de 2023. Da bancada que atuou na atual legislatura, s 70% conseguiram se reeleger nas nestas[122] eleições, taxa superior a 2018, quando cerca de 40% dos parlamentares ruralistas não foram reeleitos.

Nestas eleições, o MST postulou pela primeira vez candidaturas próprias, recebendo o apoio de outros movimentos rurais, como o MPA. No total, foram 15 candidaturas para deputados em câmaras federais e estaduais, em 12 estados. O saldo foi positivo: foram eleitos 2 deputados federais e 4 estaduais[123].

Conclusão

É possível notarmos como a realidade do campo brasileira é marcada por fatores de origens antigas. O caráter crucial do atual momento em que vivemos, cada vez mais, obriga a enfrentar a persistência de relações opressivas que põem em risco a segurança e a existência daqueles que vivem no campo. A realidade no campo afeta de diversas maneiras a realidade urbana, , sobretudo no que tange aos impactos ambientais, o que ficou evidente quando o céu da cidade de São Paulo escureceu devido a fumaças de queimadas oriundas da região amazônica124. Os interesses de empresários e trabalhadores rurais se apresentam como antagônicos. Compreender a natureza das diferentes classes sociais é um dos pontos chave para entendermos a realidade no campo de modo concreto e material.

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[102] Lucas Alencar é aluno do 7º período de Ciências Sociais na UFRJ e pesquisador do OPEL e do EduPolítica.

[103] https://www.oxfam.org.br/publicacao/menos-de-1-das-propriedades-agricolas-e-dona-de-quase-metade-da-area-rural-brasileira/

[104] https://oglobo.globo.com/blogs/capital/post/2022/08/o-empresario-com-negocios-esg-que-financia-a-campanha-de-ricardo-salles.ghtml

[105] https://www.brasildefatope.com.br/2022/09/13/avanco-do-agronegocio-tem-expulsado-familias-agricultoras-da-chapada-do-apodi

[106] https://ctb.org.br/noticias/rurais/assassinatos-no-campo-cresceram-75-nos-ultimos-dois-anos/

[107] https://oglobo.globo.com/blogs/capital/post/2022/08/o-empresario-com-negocios-esg-que-financia-a-campanha-de-ricardo-salles.ghtml

[108] https://www.brasildefato.com.br/2020/04/09/como-o-brasil-pode-enfrentar-uma-das-maiores-concentracoes-de-terras-do-mundo

[109] https://www.cartacapital.com.br/mundo/agropecuaria-e-responsavel-por-90-do-desmatamento-mundial-aponta-estudo/

[110] https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2022/10/amazonia-tem-recorde-de-desmate-em-setembro.shtml

[111] https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2021/08/11/recordes-no-agronegocio-e-aumento-da-fome-no-brasil-como-isso-pode-acontecer-ao-mesmo-tempo.ghtml

[112] https://www.brasildefato.com.br/2022/01/22/mst-completa-38-anos-com-arrecadacao-historica-contra-a-fome-e-campanha-nas-redes-sociais

[113] https://www.bbc.com/portuguese/brasil-62746336

[114] https://oglobo.globo.com/blogs/lauro-jardim/post/2022/09/doacao-milionaria-para-bolsonaro-abre-racha-numa-das-familias-mais-importantes-do-agro.ghtml

[115] https://www.condsef.org.br/noticias/governo-esvazia-incra-impedir-reforma-agraria-prejudica-todos

[116] https://www.brasildefato.com.br/2020/03/03/com-incra-sucateado-pronaf-afunda-agricultores-em-dividas-e-miseria

[117] https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/2021/06/23/ricardo-salles-entenda-operacao-contra-exportacao-ilegal-de-madeira-que-mira-ministro-do-meio-ambiente.ghtml

[118] https://ctb.org.br/noticias/rurais/violencia-no-campo-dispara-com-bolsonaro/

[119] https://www.cartacapital.com.br/sociedade/vivemos-na-ponta-da-bala-2022-ja-superou-as-mortes-no-campo-em-comparacao-a-2020/

[120] https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2022/09/empresarios-do-agronegocio-proximos-a-lula-querem-credito-verde-e-incentivo-a-biodefensivos.shtml

[121] https://exame.com/agro/como-fica-a-bancada-do-agro-frente-parlamentar-reelege-deputados/

[122] https://valor.globo.com/politica/eleicoes-2022/noticia/2022/10/06/na-camara-bancada-reune-158-deputados.ghtml

[123] https://mst.org.br/2022/10/03/mst-elege-seis-candidaturas-em-cargos-estaduais-e-federais/

[124] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/08/19/dia-vira-noite-em-sao-paulo-com-chegada-de-frente-fria-nesta-segunda.ghtml

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