Privatização da Eletrobras: uma análise do atual contexto nacional relativo às privatizações, por Lucas Alencar
O Boletim #2 está no mundo!
Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?
No décimo segundo texto “A campanha bolsonarista na mídia tradicional” (p. 77-82), a graduanda em Ciências Sociais Luísa Pinheiro analisa as dinâmicas que a campanha bolsonarista vem construindo com as mídias tradicionais.
Confira o texto abaixo!
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Privatização da Eletrobrás: Uma análise do atual contexto nacional relativo às privatizações
Lucas Alencar[1]
Resumo O presente texto é parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral 2022 e tem por objetivo analisar a relação do governo Bolsonaro, partidos políticos e atuais presidenciáveis, com o tema da privatização. Para isso, nesse segundo boletim, pretendemos nos debruçar sobre a privatização da Eletrobras, assim como evidenciar como partidos políticos e os pré-candidatos à presidência se posicionam em relação à pauta. Nossa hipótese é que através do caso “micro” da privatização da Eletrobras poderíamos aferir a opinião “macro” dos partidos e presidenciáveis em relação à temática da privatização. Para tal estudo foram analisadas matérias publicadas em diversos sites jornalísticos e institucionais tais como CNN Brasil, G1, câmara.org, Estadão e outros.
A Eletrobras e a privatização no Brasil contemporâneo
A privatização é um tema que sempre se faz presente na realidade política brasileira. Críticas acerca da capacidade, eficiência da gestão pública, ou acerca da lucratividade e qualidade dos serviços prestados são somente alguns dos muitos pontos que recorrentemente aparecem quando temos como foco esse tema.
Um recente ocorrido que exemplifica bem o debate acerca das privatizações é o caso da Eletrobras. A estatal, que foi fundada em 1962, hoje é responsável por um terço da geração de energia elétrica no Brasil, tendo ainda quase metade das linhas de transmissão do país.[2] Apesar disso, já vinha sendo alvo de empreitadas do governo Bolsonaro desde o início de seu mandato em 2019. De lá pra cá o governo já havia tentado – porém sem sucesso – privatizar a estatal [3] , seja com propostas de lei, medida provisória ou somente acenos ao tema. Porém, em 18 de maio de 2022 o plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou, por 7 votos a 1, a capitalização da estatal.[4] O modelo aprovado prevê a oferta de novas ações da empresa na bolsa de valores sem o acompanhamento da União. Ou seja, o Estado deixou de ser acionista controlador, em modelo semelhante ao adotado com a privatização da Embraer.[5]
Ainda no começo de 2022 a privatização da Eletrobras já era um dos destaques da agenda de privatizações para este ano, junto com outros projetos, como a privatização – hoje já concretizada – da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa). Outros possíveis alvos de privatização são os portos[6] de Santos[7], de São Sebastião (SP), de Itajaí (SC), além dos Correios.[8]
Vale ressaltar que esse processo de desestatização da empresa é somente um dos pontos da agenda neoliberal de privatizações do governo Bolsonaro [9], agenda essa que o presidente defendeu e se propôs a aplicar já em sua pré-campanha eleitoral.
Contudo, esse contexto de privatizações não se resume somente aos resultados, mas também ao antes, durante e depois de cada etapa dos processos que fazem parte de uma única privatização. Durante essas etapas diversos atores sociais e políticos são mobilizados. Entendendo os atores políticos como representantes partidários, podemos não só notar como estes indivíduos encaram e se posicionam frente ao atual contexto de privatizações, 194mas também como os próprios partidos se posicionam, assim podendo traçar um contorno do contexto político relativo ao tema.
O posicionamento político frente a privatização da Eletrobras e a agenda de privatizações do atual governo
Ao procurarmos o posicionamento de figuras políticas e de seus partidos em relação a privatização da Eletrobras, é possível notarmos primordialmente dois posicionamentos: o dos que são favoráveis e o dos que são contrários à empreitada. Analisando os posicionamentos,[5] notamos uma tendência de políticos de direita e centro direita a serem a favor da desestatização. Como por exemplo Luciano Bivar do União Brasil que afirma “considero que a Eletrobras pode sim ser privatizada” assim como afirma que a empresa “deverá operar no mercado sem qualquer privilégio para que a competição seja saudável”. Ou José Maria Eymael, do Democracia Cristã, que afirma “a privatização é necessária para seu crescimento”, ao falar do crescimento da empresa.
A lógica que se sobressai nessas e em outras afirmações similares, é uma lógica mais mercantil em cima da empresa, esta precisaria operar no livre mercado sem privilégios ou impedimentos por parte do Estado, sem os entraves que a administração pública – para estes que opinam – representa, como má gestão, má administração dos recursos internos, sobrecarga de folhas de pagamento, entre outras causas.
Enquanto, ao voltarmos nossa atenção para aqueles contrários, completa ou parcialmente a agenda de privatizações, acabamos nos voltando usualmente 195para políticos e partidos de centro esquerda e esquerda. Uma das figuras que exemplifica bem isso é a do ex-presidente Lula. Este, junto à presidente do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffman, vem se posicionando contra a privatização da Eletrobras, enfatizando o caráter estratégico da empresa [10]. Segundo ele, “privatização não resolve o problema, mas sim o crescimento econômico” [11].
Podemos notar posicionamento similar de outros pré-candidatos, como Ciro Gomes do Partido Democrático Trabalhista, que afirmou que a privatização da mesma seria “um golpe contra nosso patrimônio e soberania”, um saque às “riquezas nacionais”; ou Sofia Manzano Partido Comunista Brasileiro, que reiterou o caráter estratégico da empresa. [5]
Uma certa lógica que pode ser notada aqui é a ênfase e a importância que esses nomes e seus partidos dão ao caráter estratégico da empresa, não somente a uma maximização de eficiência ou de lucros, mas no caráter social que a empresa exerce, em sua influência benéfica em relação ao setor que ela ocupa.
Ao analisarmos o posicionamento destas mesmas figuras políticas, de seus partidos, ou até mesmo de outros pré-candidatos – mas que ainda assim se alinham ideologicamente no espectro político – em relação a outro processo de privatização, como por exemplo no caso das concessões dos aeroportos, podemos notar a mesma lógica sendo aplicada, ou lógicas, cada vertente política aplicando a sua respectiva.
Com relação aqueles que apoiam as concessões[12] é possível citar Luciano Bivar que acredita que “O objetivo da concessão dos aeroportos para a iniciativa privada é ampliar a infraestrutura, o que permitirá melhoria na qualidade dos serviços, aumento da oferta de voos e até redução nos preços das passagens, provocada pela concorrência.” E José Maria Eymael do DC que fala “cabe à administração pública a prestação dos serviços que lhes são inerentes, como a segurança pública.” Em contrapartida, ao voltarmos nossa atenção aos contrários, são exemplos Sofia Manzano do PCB, que diz “Esses serviços geralmente privatizados têm um aumento em diversas taxas que aumentam mais ainda os valores das viagens, restringindo seu acesso. ”Só quem perde com isso é a população brasileira, principalmente aqueles que não terão condições de 196pagar pelo serviço ofertado.” e Vera Lúcia do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado, que afirma “Os aeroportos são importantes e estratégicos para a economia e o desenvolvimento do país e devem ser controlados pelo Estado.” As privatizações têm o objetivo de repassar estatais importantes para enriquecer o bolso de grandes empresários e multinacionais, sem a garantia do serviço de qualidade à população”.
Nuances existem. Em alguns casos, os posicionamentos dos atores políticos quanto ao tema variam, a depender da empresa. Um exemplo disso é o posicionamento da atual candidata à presidência pelo Movimento Democrático Brasileiro, Simone Tebet. A senadora se diz favorável à privatização da Eletrobras, contudo, é contra um processo de privatização da Petrobras. [13]
Conclusão
Portanto, é possível notarmos que por mais que cada processo de privatização seja único, eles são fruto de uma série de nuances e do contexto em que ocorrem. Ao olharmos para os atores políticos que influenciam diretamente no avançar ou retroceder desses processos, podemos notar que estes, salvo exceções, seguem uma determinada linha de raciocínio.
Nos debruçarmos sobre esse tema não é somente olhar as justificativas que determinado candidato utiliza para sustentar posições contrárias ou favoráveis à privatização. Tais posicionamentos em relação às pautas da privatização permitem o eleitor situar os atores partidários no tabuleiro político, ou seja, mais ou menos aderentes ao receituário (neo) liberal.
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[1] Lucas Alencar é aluno do 7º período de Ciências Sociais na UFRJ e pesquisador no NUDEB/IFCS e no Edu. Política.
[4] https://g1.globo.com/economia/noticia/2022/05/18/tcu-privatizacao-eletrobras.ghtml
[6] https://www.poder360.com.br/economia/prazo-para-privatizacao-do-porto-de-santos-esta-no-limite/
[7] https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,porto-santos-privatizacao-america-latina,70004090629
[10] https://www.poder360.com.br/partidos-politicos/lula-gleisi-criticam-privatizacao-da-eletrobras/
[11] https://pt.org.br/lula-privatizacao-nao-resolve-o-problema-mas-sim-crescimento-economico/