O Boletim #8 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No décimo texto “Lula e Bolsonaro no debate da Globo: os últimos momentos de campanha na mídia tradicional”, a graduanda em Ciências Sociais Luisa Pinheiro analisa o debate presidencial ocorrido na Rede Globo no dia 29 de setembro e relaciona-se com o resultado do primeiro turno das eleições”.

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Lula e Bolsonaro no debate da Globo: os últimos momentos de campanha na mídia tradicional
Luisa Antunes Pinheiro[125]

Resumo Na véspera das eleições, os dois candidatos à presidência que seguiam liderando as pesquisas, Lula e Bolsonaro, se encontravam em lugares muito distintos. Lula, que estava à frente de Bolsonaro desde muito antes da campanha eleitoral se iniciar, parecia seguir nessa reta final com tranquilidade, ao passo que Bolsonaro constantemente recalculava sua estratégia, visto que as pesquisas indicavam um risco de perder já no primeiro turno. Porém, ainda que Lula de fato tenha ficado em primeiro lugar no primeiro turno, ele não alcançou os votos necessários para ganhar as eleições, o que definiu que haverá segundo turno. Bolsonaro, por sua vez, recebeu mais votos do que as pesquisas indicavam. Neste boletim, iremos analisar o debate presidencial ocorrido na Rede Globo no dia 29 de setembro e relacioná-lo com o resultado do primeiro turno das eleições.

Antecedentes: os caminhos das propagandas eleitorais

No dia 26 de agosto de 2022, o horário eleitoral gratuito se iniciou. No primeiro dia de exibição das propagandas, uma sexta-feira, as candidaturas que se apresentavam eram as do senado, governos e deputados estaduais. As propagandas dos candidatos à presidência foram reservadas para as terças-feiras, quintas-feiras e sábados. Entretanto, ainda no dia 26, as campanhas presidenciais já apareciam nos pequenos comerciais ao longo do dia. Em sua primeira inserção, a campanha de Bolsonaro apostou na divulgação do Auxílio Brasil. O candidato aparecia no comercial de 30 segundos dizendo que, no passado, o Bolsa Família valia em média 192 reais e que em seu governo foi criado o Auxílio Brasil, destinando às famílias um valor que chegou a 600 reais. No dia 8 de setembro, a propaganda de Bolsonaro também abordou o tema do auxílio, divulgando, sob o lema da diferença entre dar o peixe e ensinar a pescar, a proposta de aumento de mais 200 reais de auxílio para beneficiários com carteira assinada. Em seguida, a propaganda enfatizava que, no antigo Bolsa Família, as pessoas deixavam de trabalhar para receber o auxílio, já que ele era destinado apenas a desempregados. A comparação, portanto, deixava a mensagem de que, enquanto o governo Bolsonaro “ensina a pescar”, o governo Lula apenas “dava o peixe”.

A aposta na associação de Bolsonaro ao programa de transferência de renda, que, na realidade, chegou ao valor de 600 reais pela pressão de sua oposição no Congresso, foi uma aposta em dois aspectos potencialmente vantajosos para sua candidatura: a promessa de uma ação da qual a população já pôde se beneficiar e a sua diferenciação do Bolsa Família, um dos marcos dos governos do PT[126]. Apesar disso, e do histórico brasileiro amplamente favorável a candidaturas à reeleição, antes do resultado das urnas no primeiro turno, Bolsonaro apresentava um índice recorde de rejeição e uma intenção de voto consideravelmente inferior em relação a Lula[127]. Por isso, sua campanha recorreu também a outras estratégias para angariar mais votos. A ida aos debates, por exemplo, não pôde ser deixada de lado, como em 2018. Bolsonaro compareceu aos debates da Band, do SBT e da Globo.

Debate da Globo

Na véspera das eleições, Lula marcava 50% dos votos válidos nas pesquisas[128]. Bolsonaro, que não passava dos 36%, apresentou nas últimas semanas de campanha uma postura diferente da mantida na maior parte do tempo. Sua campanha parece ter mudado de estratégia: antes, Bolsonaro tentava se manter mais contido nas frases normalmente absurdas, provavelmente com o intuito de conquistar votos para além de sua base. Depois, na reta final, a estratégia parece ter se reorientado para uma postura mais “combativa”, relembrando sua candidatura de 2018.

Poucos dias antes do debate, o presidente já aparentava buscar justificativas para uma hipotética “vitória” de Lula no debate em si. Alfinetou o ex-presidente ao passo que retornou com suas críticas mais explícitas à Rede Globo. Como vimos no último boletim, após sua entrevista ao Jornal Nacional, realizada em agosto, Bolsonaro comentou em suas redes que pôde esclarecer fatos pouco noticiados pela emissora. Já nas últimas semanas de setembro, o candidato saiu do tom de deboche e partiu para falas mais diretas, à semelhança de sua postura em 2018. Fazendo referência à ausência de Lula no debate do SBT, que aconteceu no dia 24 de setembro, Bolsonaro disse que o petista iria na Globo porque esta seria “a terra dele”, e que o presidente, por sua vez, iria “entrar na sala do capeta”[129]. Sua propaganda eleitoral transmitida no dia do debate da Globo reforçou seu argumento de que a emissora favorece Lula e que, por isso, os artistas estariam em seu favor: “A Rede Globo e seus artistas precisam do Lula. O interesse é deles, e só deles.”[130].

Na primeira pergunta respondida por Bolsonaro no debate, sua postura indicava sua truculência como escolha de campanha novamente: os mesmos ataques ao governo do PT e à grande mídia, especialmente à Rede Globo, baseados, em sua maioria, em fake news. Perguntado sobre o Auxílio Brasil pelo candidato Padre Kelmon, que se esforçava para defender os pilares do bolsonarismo, Bolsonaro pôde começar sua primeira fala no debate sobre a propaganda do auxílio que foi feita durante a campanha até então. Neste momento, o candidato ainda deu coro a uma fake news surgida em 2021, de que o PT votou contra o Auxílio Brasil[131]. Em seguida, após outra fala de Kelmon, Bolsonaro deu início aos ataques deliberados ao governo do PT: começando pela acusação de “roubalheira”, da qual o governo Lula teria sido “chefe de uma grande quadrilha”, Bolsonaro retornou também com a fake news sobre o ensino de “ideologia de gênero nas escolas”, que induziria crianças a se “interessarem por sexo precocemente”; disse que o PT quer a “liberação das drogas” e que Lula, ao estimular o desarmamento da população de bem, o ataque aos policiais e o roubo de celulares, “estimula a violência em nosso país”. Por fim, Bolsonaro atacou a Rede Globo: “E eu acabei com a mamata. Em especial, da grande mídia, a Rede Globo foi uma que eu acabei com a mamata com eles, e bem como botei um fim nos abusos”.

Em resposta, Lula fez menção aos escândalos do governo Bolsonaro, como a rachadinha e a compra das vacinas na pandemia. Além disso, mencionou o sigilo de 100 anos decretado sobre esses escândalos. A resposta de Lula retrucando Bolsonaro com críticas sobre seu governo e sua postura enquanto presidente também demonstra uma mudança em sua abordagem em comparação ao debate da Band, realizado no dia 28 de agosto. Neste primeiro debate, Lula, quando acusado de corrupção, apenas citou as políticas realizadas em seu governo para o combate da mesma. A ausência de críticas a Bolsonaro por parte do candidato deu espaço para a candidata Simone Tebet, que se destacou no debate no quesito de enfrentamento ao atual presidente, enquanto Lula ficou mais apagado. Dessa vez, o ex-presidente foi mais enérgico nas críticas a Bolsonaro e também a Ciro Gomes, com quem abriu o debate ao responder a primeira pergunta, feita por Ciro. Ao contrário de Bolsonaro, Lula aparentava tranquilidade no começo do debate.

Passado o primeiro bloco, com direito a gritos de Bolsonaro interrompendo a fala de Lula, os ânimos mudaram. O atual presidente e sua assessoria ensaiaram uma mudança na estratégia, visto que o candidato, antes reativo, se recompôs e assumiu uma postura mais calma a partir do segundo bloco[132]. O ataque ao Lula de modo destemperado dialoga com seus eleitores de base mais sólida, porém, pode não ser bem recebido pelos demais espectadores.

Para além de sua própria presença e postura, Bolsonaro contava com outra vantagem no debate: o candidato Padre Kelmon. O padre foi escalado para ajudar o desempenho de Bolsonaro no debate, visto que suas campanhas estavam totalmente alinhadas. Sua figura, entretanto, foi uma peça um tanto quanto controversa. A discussão do padre com a candidata Soraya e posteriormente com Lula, que perdeu a paciência pela primeira vez ao longo da transmissão, deu um tom de tumulto ao debate, o que poderia desagradar alguns dos eleitores. O candidato, que foi chamado por Lula de “laranja”, cumpria a agenda bolsonarista de pautas baseadas no fundamentalismo religioso, no anticomunismo, antipetismo e, em sua maioria, baseadas em fake news. Sua atuação enquanto linha auxiliar de Bolsonaro pode ter sido impactante nos votos que o presidente parece ter recebido de última hora. O “candidato padre”, por sua vez, alcançou apenas 0,1% dos votos.

O resultado das urnas

Apesar de Bolsonaro cambalear na estratégia do debate que ocorreu às vésperas da eleição, o resultado das urnas demonstrou que sua força, neste momento, é maior do que as pesquisas indicavam. O candidato não ganhou no primeiro turno, confirmando que Lula de fato é o presidenciável favorito no momento, entretanto, os votos que recebeu foram mais do que os esperados. Esse fato pode ser explicado por muitas hipóteses, uma delas é a relevância da campanha bolsonarista em redes sociais como Telegram e WhatsApp. O bombardeio de fake news no dia em que as pessoas estão saindo para votar pode ser decisivo para o eleitor que ainda estava incerto sobre seu voto. Nas eleições de 2018, essa máquina das redes foi também central para a vitória de Bolsonaro. Dessa vez, com seu alto índice de rejeição, sua campanha precisou dialogar com a mídia tradicional, porém, talvez a esfera digital ainda dê mais sustância ao bolsonarismo do que era esperado para 2022, confirmando que o que houve em 2018 não ficou isolado no passado.

Ainda assim, para alcançar Lula no número de votos, Bolsonaro precisa conquistar 6 milhões de pessoas para seu eleitorado, o que não é pouco. Por isso, com a confirmação de que haveria segundo turno, sua campanha já começou os trabalhos, investindo em um dos seus pilares: o Auxílio Brasil. O pagamento do auxílio do mês de outubro foi adiantado por Bolsonaro[133]. A campanha de Lula, por sua vez, segue com objetivo de manter os votos que já recebeu e de conquistar mais votos à direita. No próximo boletim, analisaremos qual foi de fato o peso das mídias, tradicionais e digitais, na campanha dos dois presidenciáveis em questão.

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[125] Graduanda em Ciências Sociais na UFRJ e Pesquisadora do Observatório Político Eleitoral (Opel).

[126] https://oglobo.globo.com/politica/eleicoes-2022/noticia/2022/08/esquerda-propos-auxilio-brasil-de-r-600-permanente-mas-governo-orientou-base-a-votar-contra-no-congresso.ghtml

[127] https://www.uol.com.br/eleicoes/2022/05/27/bolsonaro-tem-maior-rejeicao-entre-presidentes-que-ja-tentaram-reeleicao.htm

[128] https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2022/pesquisa-eleitoral/noticia/2022/09/29/datafolha-votos-validos-lula-50percent-bolsonaro-36percent.ghtml

[129] https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/eu-vou-entrar-na-sala-do-capeta-diz-bolsonaro-sobre-debate-na-tv-globo/

[130] https://www.youtube.com/watch?v=o6aenjh4zpE&list=PL1wHUIp3LRJeuBSBhsBsqDORDVH4MqyBc&index=1

[131] https://br.noticias.yahoo.com/checamos-pt-nao-votou-contra-o-auxilio-brasil-151159573.html?guccounter=1&guce_referrer=aHR0cHM6Ly93d3cuZ29vZ2xlLmNvbS8&guce_referrer_sig=AQAAADnneArNgF_Lf4GyrNAawEPffLg46A3_oR96uEeLT9faJqokmZgxUaC7RIhrQAKu1VIKQNBA3uYu9XVMxTsQfVBvArdsbbZzFgAulh10m1g8A3UR0cnKWvFDJMD8e9oY-k3OMFFSk8pRHdXCaWFV9NzjLMNSUDfjxAG51SXnkE7b

[132] https://www.brasildefato.com.br/2022/09/29/bolsonaro-perde-o-controle-e-atrapalha-a-dinamica-do-debate-no-primeiro-bloco

[133] https://congressoemfoco.uol.com.br/area/governo/apos-anuncio-de-segundo-turno-bolsonaro-antecipa-auxilio-brasil-para-antes-da-eleicao/

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