Assédio eleitoral às vésperas do segundo turno da eleição de 2022, por Lucas Alencar
O Boletim #10 está no mundo!
Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?
No décimo texto “Assédio eleitoral às vésperas do segundo turno da eleição de 2022” (p. 56), o graduando em Ciências Sociais Lucas Alencar analisa o tema do assédio eleitoral, com foco nos casos ocorridos às véspera do segundo turno.
Confira o texto abaixo!
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Assédio eleitoral às vésperas do segundo turno da eleição de 2022
Lucas Alencar [93]
Resumo O presente texto é parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral de 2022 e tem por objetivo trazer uma análise sobre o tema do assédio eleitoral. Para isso, neste boletim, pretendemos abordar pontos como: do que se trata o assédio eleitoral e de que formas e modos ele pode vir a se configurar, além de comparar os atuais números de casos com os de períodos anteriores e fazer uma breve análise das possíveis consequências desse quadro na sociedade. Para tal estudo foram analisadas matérias publicadas em sites jornalísticos como CartaCapital, O Globo, G1, Agência Brasil, Folha de São Paulo, entre outros.
Assédio eleitoral
O assédio eleitoral não é uma novidade dessa eleição. Às vésperas do segundo turno das eleições, o número de denúncias e de casos investigados de assédio eleitoral eram crescentes. Pelo contrário, a própria história da democracia brasileira é marcada por casos similares de coerção eleitoral. Um dos exemplos mais emblemáticos deste fenômeno histórico é conhecido como voto de cabresto, aquele em que o eleitor escolhia um candidato por determinação de um chefe político ou cabo eleitoral[94]. É um erro acreditar que situações de coerção e assédios eleitorais são eventos superados, o crescimento alarmante no número de casos registrados na disputa entre Bolsonaro e Lula mostra-se um expoente símbolo dessa realidade ímpar do Brasil.
Resumidamente, assédio eleitoral é quando um empregador ou empresário, por exemplo, tenta influenciar o voto de seus empregados ou prestadores de serviço. Como esse assédio pode assumir diversas e diferentes formas, muitas vezes os indivíduos nem mesmo sabem que estão sendo vítimas de um crime. Promessas de benefícios e vantagens, ameaças de perda de emprego, exigência de participação em manifestação político-partidária[95], mudança na carga horária para evitar que os funcionários votem, são somente algumas das formas em que essa prática pode se apresentar, todas com o objetivo de tentar influenciar ou coagir os empregados a apoiarem aquele candidato ou candidata que o empregador defende.
Porém, tão importante quanto reconhecer a prática e como ela ocorre, é o trabalhador conhecer as formas para resguardar seu direito legal ao voto livre. A principal é a denúncia. São muitos os canais pelos quais as denúncias desse crime podem ser encaminhadas ou registradas, sendo alguns deles: o site do Ministério Público do Trabalho, o aplicativo MPT (Ministério Público do Trabalho) Ouvidoria, o aplicativo Pardal, que também se comunica com o Ministério Público Eleitoral, o sindicato de cada categoria, o Ministério Público Federal, assim como as procuradorias regionais[96]. Por meio das denúncias, os órgãos de fiscalização responsáveis têm a possibilidade de averiguar, com maior precisão, a realidade dos trabalhadores e agir baseados nela. Um exemplo recente, foi o crescimento no número denúncias que motivou o Ministério Público do Trabalho em Minas Gerais, o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público Estadual de Minas Gerais (MPMG) a realizarem uma audiência pública para discutir o assunto na tarde de sexta-feira dia 21/10[97].
Véspera de segundo turno
Oitocentos por cento[98], esse foi o aumento do número de denúncias de assédio eleitoral registrado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em relação ao primeiro turno. As denúncias relatam um ponto em comum: os empregadores que assediaram seus funcionários são majoritariamente em favor do candidato Bolsonaro. Até o dia 20/10/22, eram ao menos 701 casos investigados pelo órgão. Hoje, há poucos dias da eleição, já foram registradas 1.633 denúncias de assédio eleitoral no MPT, quase oito vezes o patamar registrado na eleição de 2018, quando o total chegou a 212[99]. Para o procurador geral do trabalho, José de Lima Ramos Pereira, a polarização política e o acirramento da disputa explicam o disparo nos números de assédio nessa eleição.
Sejam quais forem as causas exatas que nos trouxeram ao atual quadro, fato é que, mesmo com os diversos casos investigados e punidos pelo MPT, os números continuam crescendo. Vale a pena nos atentarmos para o fato que o assédio eleitoral se baseia primordialmente no desequilíbrio de poder entre patrão e empregado, no qual o trabalhador acaba por se sujeitar a situações degradantes devido a este desequilíbrio. Cabe então aos órgãos de fiscalização e execução da lei, atribuir punição proporcional ao crime em defesa do trabalhador, atuando como contra peso nessa balança, regulando aqueles que abusam de sua influência e poder para com seus subordinados, seja com as punições em si ou sentenças que sirvam de exemplo para coibir outros casos.
Contudo, o que pode ser notado é que, em diversos casos, a punição para os infratores é pouco efetiva. Comumente somente uma retratação, uma ordem de suspensão da prática ou, em alguns poucos casos, o pagamento de multas. A Justiça do trabalho no RS, por exemplo, determinou que empresa que ameaçou redução de orçamento em caso de vitória de Lula informasse funcionários que voto é livre[100]. Em outro caso em Minas Gerais, a Justiça obrigou o prefeito a suspender práticas de assédio eleitoral contra servidores e se retratar[101]. Em Betim, a Justiça determinou 24 horas para que frigoríficos se retratassem por assédio eleitoral[102]. Esse tipo de julgamento acaba por favorecer o infrator. A mensagem do assédio continua e a demonstração de poder e influência se mantém, acabando por favorecer portanto, a impunidade daqueles que assediam.
Conclusão
É complexo conjecturar acerca das possíveis consequências que os muitos casos de assédio eleitoral possam vir a ter efetivamente nas eleições. Contudo, é possível compreender que, sem a devida fiscalização e real punição daqueles que cometem tais atos, os casos tendem somente a crescer com a impunidade e punições demasiadamente brandas.
A fala de Sérgio Nobre, presidente nacional da CUT, Central Única dos Trabalhadores, aponta esse perigo: “Se não houver um sinal imediato e mais forte das instituições para coibir patrões que, de forma criminosa, estão obrigando trabalhadores a votar em Jair Bolsonaro (PL), essa onda de assédio eleitoral pode influenciar o resultado da eleição.”[103]. Senadores apresentaram pedido de CPI para apurar assédio eleitoral cometido por empresários e prefeitos[104], buscando uma maior investigação e análise acerca desse quadro de assédios e coerções que vem ocorrendo de modo tão generalizado recentemente.
Portanto, é evidente que, assim como no passado, ainda hoje o assédio eleitoral se faz um problema sério no Brasil, seja ele motivado por interesses próprios, polarização política ou outros motivos. Dessa forma, cabendo às instituições e, principalmente, aos órgãos de fiscalização e proteção ao trabalhador, estarem constantemente buscando formas de fiscalizar e auxiliar sempre que necessário aqueles que mais dependem de seu trabalho e serviços.
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[93] Lucas Alencar é aluno do 8º período de Ciências Sociais na UFRJ e pesquisador do OPEL e do Edu. Política
[103] http://www.cut.org.br/noticias/se-as-instituicoes-nao-agirem-ja-coacao-podera-influenciar-no-