O Boletim #1 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No sexto texto “As mulheres e as eleições: comportamento eleitoral feminino e representatividade de gênero na política” (p. 30-34), a graduanda em Ciências Sociais Carolina Tostes analisa a participação política de mulheres, não só nas eleições, mas em articulações coletivas dentro e fora da vida institucional.

Confira o texto abaixo!

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As mulheres e as eleições: comportamento eleitoral feminino e representatividade de gênero na política
Carolina Tostes [37]

Resumo O presente texto é parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral 2022 e tem por objetivo analisar a participação política de mulheres, não só nas eleições, mas em articulações coletivas dentro e fora da vida institucional que afetam de forma direta os rumos da sociedade. Para isso, nesse primeiro boletim, foram levantados alguns episódios dos últimos anos em que diversas figuras e grupos femininos demonstraram expressividade e engajamento para se articularem com determinados campos e atores. Para tal estudo, o recolhimento e seleção de materiais irá se concentrar em entrevistas escritas e gravadas para jornais e outros meios de comunicação, priorizando aqueles com maior alcance.

Histórico e contextualização: como estamos e chegamos até aqui

Segundo a União Interparlamentar, organização que analisa parlamentos mundiais, o Brasil ocupa o 142º lugar na lista internacional que aponta a participação de mulheres na política, à frente apenas do Haiti na América Latina [38]. Em um momento em que o debate sobre gênero e representatividade está cada vez mais latente, esse dado demonstra uma séria lacuna nos ambientes institucionais envolvendo pluralidade de ideias, projetos e corpos. Para além dos cargos públicos, as mulheres também ocupam papéis decisivos em momentos importantes da conjuntura brasileira. Um exemplo é 2018, quando ocorreu uma acentuada diferenciação no comportamento eleitoral de homens e mulheres, especialmente nas eleições presidenciais [39]. O atual presidente Jair Bolsonaro concentrava, no começo de outubro, 55% da intenção de voto do eleitorado masculino e 45% do feminino, em que também recebia maior rejeição, expressa, por exemplo, nos atos massivos e nacionais do “Ele Não”  [40], ocorridos dias antes das eleições.

A sucessão de eventos determinantes do que aqui se entende por Brasil contemporâneo – um contexto que se inicia com o cenário político pós-2013, passa pelo golpe parlamentar de 2016 e culmina dois anos depois na eleição de Jair Bolsonaro – possui grande protagonismo de mulheres, tanto do campo da esquerda quanto da direita. Se por um lado o antigo partido do atual presidente e seus aliados trouxe candidaturas expressivas de parlamentares com alinhamento ideológico conservador, com nomes como Carla Zambelli e Bia Kicis, a mobilização de movimentos sociais e feministas, ao lado do assassinato da vereadora Marielle Franco, abriu espaço para um debate envolvendo classe e raça em conjunto com o gênero. Conhecidas como “sementes de Marielle”, diversas mulheres negras periféricas e LGBTQIA+ foram candidatas pelo Brasil reivindicando o legado da parlamentar [41] .

As mudanças de conjuntura e o desenrolar do cenário atual

Diferente de 2018, em que houve um esforço dos presidenciáveis em escolher vices mulheres, com chapas como Guilherme Boulos e Sônia Guajajara (PSOL); Ciro Gomes e Katia Abreu (PDT); Fernando Haddad e Manuela D’ávila (PT/PCdoB), as eleições de 2022 apresentam um cenário dominado por personagens masculinos. Este cenário se repete também nas eleições estaduais. Pesquisas já apontam que mulheres são apenas 1 em cada 7 pré-candidatos aos governos estaduais do país [42] . Na contramão desses dados, existe uma crescente ampliação da presença de temas relacionados a esse grupo no vocabulário político cotidiano, seja por meio de discursos envolvendo temas clássicos do discurso feminista como a reinvindicação da legalização do aborto, mas também da desigualdade em ambientes de trabalho, violência doméstica e maternidade.

A ideia de violência de gênero também se faz presente quando falamos sobre a relação entre mulheres e política. Os mais diversos casos de misoginia dentro de casas de poder, mas também entre movimentos sociais e partidos, representam um sintoma de que, por mais que tenham ocupado espaços significativos, o machismo estrutural atinge todos os campos na tentativa de deslegitimar vozes e reivindicações. O caso mais marcante e exemplar, defendido por diversos pesquisadores, pode ser demonstrado a partir do golpe parlamentar de 2016, em que o discurso conservador e, consequentemente, antifeminista, já se apresentava como um grande mobilizador político nos argumentos para a desqualificação de Dilma Rousseff [43] . Para além de acusações à sua gestão no cargo, a então presidenta era alvo de diversos ataques misóginos nas redes sociais. Não só a sua imagem era usada de forma pejorativa e ridicularizada, mas as fakes news sobre seu suposto envolvimento com movimentos pró-aborto e uso de remédios controlados, que operavam com o objetivo de construção de uma imagem de louca ou descontrolada, também ganharam cena nas mídias e nas redes sociais [44].

A partir disso, vale considerar que, pressupondo que 2022 deva apresentar um cenário muito diferente daquele de 2018, em que, como dito, a conjuntura política impulsionou diversas candidaturas femininas a partir de diferentes frentes, será um momento importante de entender como essas personagens se articulam também de forma individual, e se, nesse caso, possuem um eleitorado relativamente estável para além das movimentações envolvendo outros atores políticos e movimentos sociais. Nomes como Joice Hasselmann, em 2018 aliada principal do governo Bolsonaro e eleita como deputada federal em São Paulo batendo recorde de 1 milhão de votos, fez um giro de rompimento com o atual presidente e de mudança de partido, indo do PSL para o tradicional PSDB. O entendimento dessas mulheres como figuras com agência política e motivações próprias é um importante passo para compreender suas movimentações dentro de diferentes campos e em relação com outros articuladores.

Contradições e projeções sendo construídas

Como já dito, não só em anos eleitorais como na dinâmica política de forma geral, as relações entre partidos, figuras públicas e os próprios movimentos sociais sempre geram questionamentos e contradições. Enquanto o campo progressista se encaminha para candidaturas expressivas marcadas prioritariamente por homens brancos – como a chapa presidencial Lula/Alckmin – outros setores têm se articulado para ressonar o debate sobre gênero dentro da política. Dessa forma, dia 24/05, os partidos MDB e Cidadania confirmaram a pré-candidatura de Simone Tebet (MDBMS) à Presidência [45] como uma alternativa da 3ª via. A atual senadora já tem sido cobrada para emitir posicionamentos sobre temas polêmicos e latentes, como legalização do aborto e a Lava Jato [46] , e tem tentado ganhar a simpatia dos mais diversos campos. A partir disso, chavões como “mulher vota em mulher” [47] e promessas de paridade de gênero nos Ministérios caso eleita já estão sendo feitas ao eleitorado. Nessa mesma linha, mas em cenário estadual, o atual governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL-RJ), também tem buscado uma vice mulher para sua tentativa de reeleição [48] .

Conclusão

O presente texto e os próximos que seguirão ao longo dos meses buscarão compreender o papel de gênero nas mais diversas dimensões que envolvem não só o processo eleitoral, mas também o amplo espectro da vida política – entendida aqui não como instância limitada à ocupação de espaços institucionais, mas sim como forma de expressão de um eleitorado feminino com suas contradições, pautas e articulações. Mulheres representam 51% da população brasileira e têm participado de forma cada vez mais ativa nos debates públicos sobre o rumo do país e de seus estados e cidades, independentemente de suas posições ideológicas dentro do sistema político brasileiro.

Dessa forma, analisando os processos que já estão se desenrolando para as eleições no final do ano, espera-se conseguir também diagnosticar os comportamentos dos campos políticos quando se trata do papel de gênero, tanto no sentido de impulsionamento de candidaturas, visibilidade e representação, quanto no eleitorado e aliados que são mobilizados para tais objetivos.


[37] Carolina Tostes é aluna do 5º período de Ciências Sociais na UFRJ e pesquisadora do NUDEB/IFCS.

[38] “Brasil é 142 na lista internacional que aponta participação de mulheres na política” https://www.cnnbrasil.com.br/politica/brasil-e-142-na-lista-internacional-que-aponta-participacao-de-mulheresna-politica/

[39] “Eleições 2018: Como o voto feminino, que pode ser decisivo, virou campo de batalha nesta eleição” https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45690313

[40] “Mulheres lideram atos contra Bolsonaro no Brasil e no mundo” https://www.brasildefato.com.br/2018/09/29/mulheres-lideram-atos-contra-bolsonaro-no-brasil-e-no-mundo

[41] “Rio de Janeiro é o estado com mais mulheres negras concorrendo em 2018” https://congressoemfoco.uol.com.br/area/pais/rio-de-janeiro-e-o-estado-com-mais-mulheres-negras-concorrendoem-2018/

[42] “Mulheres são apenas 1 em cada 7 pré-candidaturas a governos estaduais” https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/05/mulheres-sao-apenas-1-em-cada-7-pre-candidatos-a-governosestaduais.shtml?utm_campaign=resumo-do-dia&utm_content=hyperlinktexto&utm_medium=email&utm_source=newslette

[43] ‘’5 anos do impeachment: entenda o papel do machismo no processo…’’ https://www.brasildefato.com.br/2021/04/17/5-anos-do-impeachment-entenda-o-papel-do-machismo-noprocesso-contra-dilma-rousseff

[44] “”Capa da IstoÉ é baixa e reproduz misoginia, diz Dilma”” https://exame.com/brasil/capa-da-istoe-e-baixa-ereproduz-misoginia-diz-dilma/ 45

[45] “MDB e Cidadania confirmam pré-candidatura de Simone Tebet à Presidência” https://www.cnnbrasil.com.br/politica/mdb-confirma-pre-candidatura-de-simone-tebet-a-presidencia/

[46] “Simone Tebet é cobrada a se posicionar sobre temas polêmicos e ‘descer do muro” https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painel/2022/05/simone-tebet-e-cobrada-a-se-posicionar-sobre-temaspolemicos-e-descer-do-muro.shtml

[47] “Tebet diz que ‘mulher vota em mulher’ no primeiro discurso após desistência de Doria” https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2022/05/tebet-diz-que-mulher-vota-em-mulher-no-primeiro-discursoapos-desistencia-de-doria.ghtm

[48] “Com resistência no eleitorado feminino, Castro busca uma vice para sua chapa no Rio” https://blogs.oglobo.globo.com/bela-megale/post/com-resistencia-no-eleitorado-feminino-castro-busca-uma-vicepara-sua-chapa-no-rio.html

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