A questão racial nas eleições de 2022: análise da agenda antirracista dos candidatos ao governo do Estado do Rio de Janeiro, por Laryssa S. C. Miranda
O Boletim #8 está no mundo!
Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?
No quarto texto “A questão racial nas eleições de 2022: análise da agenda antirracista dos candidatos ao governo do Estado do Rio de Janeiro”, a graduanda em Sociologia Laryssa Miranda analisa as propostas antirracistas apresentadas pelos candidatos ao governo do Estado do Rio de Janeiro, além de breve repercussão referente ao resultado do pleito.
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A questão racial nas eleições de 2022: análise da agenda antirracista dos candidatos ao governo do Estado do Rio de Janeiro
Laryssa S. C. Miranda[40]
Confira o texto abaixo!
Resumo O presente texto é parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral 2022 e tem por objetivo analisar as propostas antirracistas apresentadas pelos candidatos ao governo do Estado do Rio de Janeiro. Este boletim discorre sobre os principais tópicos abordados pelos programas no que diz respeito a promoção da igualdade étnico-racial. Acreditamos que, apesar da população carioca e fluminense ser composta majoritariamente por pretos e pardos (mais de 50%), temas ligados a mitigação do racismo e preservação da vida de homens e mulheres negras não ocupam o cerne do debate político. O candidato Claudio Castro (PL), nome que no momento lidera as pesquisas de intenção de voto, não considera tais questões em suas propostas, o mesmo se aplica aos candidatos Rodrigo Neves (PDT) e Paulo Ganime (NOVO). Para tal estudo, foram analisados os sites TSE, G1, Uol e CNN. As propostas dos respectivos candidatos estão disponíveis no site https://divulgacandcontas.tse.jus.br
Apresentação
Ao longo desses 43 dias, a população do Rio de Janeiro teve a oportunidade de conhecer um pouco melhor as figuras que almejam governar o estado pelos próximos 4 anos. Temas de maior interesse público como emprego, segurança pública, saúde e economia estiveram no centro dos 3 debates propostos pelos principais veículos de comunicação.
Fugindo dos temas clássicos, pautas como as demandas das mulheres foram constantemente abordadas no decurso das argumentações, o que não ocorreu por acaso visto que esse grupo representa a maioria do eleitorado brasileiro apto a votar (52,65%)[41]. Corrupção esteve entre os assuntos mais citados tanto durante os debates à Presidência quanto nos debates ocorridos entre os candidatos ao governo do Rio de Janeiro – uma vez que, porventura, o candidato Cláudio Castro, atual governador do Rio de Janeiro, teve recentemente o seu nome envolvido em escândalos como, por exemplo, o direcionamento de verbas para cargos fantasmas no CEPERJ[42].
Por outro lado, tópicos relacionados à pauta étnico-racial não foram devidamente abordados ao longo das discussões. Dessa maneira, esse boletim concentrará esforços para analisar aqueles projetos que contemplam uma agenda antirracista. Para isso, foram selecionados 4 dos 9 candidatos ao governo do Rio de Janeiro, a escolha se deu em virtude da presença de um programa voltado, mesmo que de maneira acanhada, às questões raciais. Não foram encontrados tópicos antirracistas nas propostas dos candidatos Cláudio Castro (PL), Paulo Ganime (NOVO) e Rodrigo Neves (PDT).
Essa listagem terá como ponto de partida Marcelo Freixo, professor e Deputado Federal eleito pelo seu antigo partido PSOL, atual concorrente ao cargo de governador pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). Freixo tem uma carreira política marcada por uma intensa atuação militante frente aos direitos humanos, sendo a mais expressiva a fiscalização dos direitos dos encarcerados pelo Estado.
Por toda a extensão do seu material organizado em 100 páginas, o deputado discorre sobre temas como educação, saúde, desenvolvimento econômico e trabalho.
No tópico “2.9 direitos humanos, diversidade, igualdade racial e direitos das mulheres” o candidato denuncia as mazelas do racismo quando afirma que as “chances de uma pessoa negra ser assassinada são 2,6 vezes superior à de uma pessoa não negra.” Denuncia as ações policiais que culminam na morta de negros e negras que são, em sua maioria, jovens que moram nas favelas cariocas[43].
Algumas das propostas de enfrentamento a política de morte que vitima o povo preto está vinculada à educação, é dito que ” para isso (prevenção da violência) será implementado o programa prosperidade, que é baseado na ampliação da oferta de educação integral e políticas de incentivo à permanência e qualificação profissional para jovens em situação de vulnerabilidade social.” Além do braço da segurança pública, Freixo propõe o combate à intolerância religiosa por parte do Poder Público, com a implementação de políticas públicas efetivas de promoção da diversidade e da liberdade religiosa.”
Em 2004, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, foi criado o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome (MDS) com o objetivo de estruturar uma rede integrada de proteção e promoção social, articulando políticas de Assistência Social, de Segurança Alimentar e Nutricional, de Renda, Cidadania e Inclusão Produtiva. A partir de 2005 foi reformulado e consolidado como o Sistema Único de Assistência Social, o SUAS. Esse conjunto institucionalizado de valores concentra as pautas relativas aos Direitos Humanos[44].
Juliete Pantoja Alves (Unidade Popular) entende que para combater as desigualdades sociais, se faz necessário “unificar todas as políticas públicas relacionadas aos Direitos Humanos em uma secretaria com foco único que congregue as 11 Coordenadorias da mulher, de combate ao racismo e promoção da igualdade racial, da comunidade LGBTQIA+, da Pessoa com deficiência e da pessoa idosa.” Acredita que essa é a solução para aproximar todas as pautas das organizações sociais setoriais e da população em geral[45].
A candidata afirma que o combate ao racismo será uma das prioridades do seu governo, seja nas instituições ou na sociedade como um todo. Entre os tópicos se destacam: a promoção de campanhas educativas permanentes e em massa sobre as questões apresentadas; o combate ao racismo religioso; a efetivação das leis 10.639/2003 e 11.645/08 a fim de incluir a história e cultura afro-brasileira e indígena nos currículos escolares; e, por fim, a apresentação de um projeto para a retirada de estátuas, nomes de ruas, praças, escolas e demais logradouros e equipamentos municipais que homenageiam personalidades racistas.
Cyro Garcia, candidato do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU), compreende que os setores mais oprimidos da classe trabalhadora são os que mais sofrem diante das calamidades que atravessaram e atravessam o Brasil. Pontua em seu plano de governo que negros são as principais vítimas das ações policiais, da negligência frente ao combate a COVID-19 e até mesmo em relação a tragédias como a que ocorreu no início deste ano (2022) em Petrópolis[46].
O candidato concentra todos os problemas socioeconômicos no capitalismo, afirma que não bastam boas ideias, mas um programa que faça oposição a esse sistema. A desmilitarização da Polícia Militar (PM), sindicalização dos policiais e punição daqueles que estão envolvidos em massacres e assassinatos são alguns dos tópicos apresentados por Cyro a fim de mitigar a violência policial que coopera para o genocídio da população negra. Almeja que a polícia militar se coloque a serviço da defesa dos setores mais oprimidos, combatendo o machismo, racismo, a xenofobia, a LGBTIfobia e o capacitismo.
Para Eduardo Gonçalves, a raiz do racismo e outras políticas de ódio está no capitalismo. O candidato do Partido Comunista Brasileiro (PCB) entende que a exploração capitalista gera opressões e preconceitos, além da pobreza e desigualdade extremas. Algumas das soluções pensadas por Eduardo contemplam a mobilização popular por meio de conselhos populares. Uma vez eleito, dará apoio às entidades que tem como escopo de atuação o combate às desigualdades de gênero, orientação sexual e raça. A educação atuará como um mecanismo de combate as opressões citadas, à partir de uma grade curricular voltada ao ensino antirracista, antimachista e contra a homofobia[47].
O programa de Eduardo Serra, assim como os programas apresentados pelos candidatos aqui mencionados, visa a aplicação da lei que obriga as escolas de ensino fundamental e médio a ensinarem sobre a história e cultura afro-brasileira.
Um ponto abordado por Serra que não foi apresentado pelos outros candidatos faz menção à política habitacional. É dito que o governo defenderá territórios de moradia e quilombos contra ataques da especulação imobiliária, a ação proposta é o reconhecimento jurídico definitivo da titularidade integral desses territórios. A aceleração do processo de titulação acontecerá por meio da Lei Titula Rio. O fortalecimento do Conselho Estadual dos Direitos do Negro e Promoção da Igualdade Racial também compõe o plano de ação antirracista. É pontuado que a preservação dos direitos de culto das religiões de matriz africana se dará pela ação do Estado e pelo diálogo inter-religioso.
O segundo ponto que diferencia a proposta apresentada por Eduardo Serra das propostas apresentadas por outros candidatos está ligado às populações indígenas, já que em nenhum dos projetos analisados foi abordada a questão dos povos originários. O candidato, por sua vez, afirma que esse grupo será reconhecido e terá os seus direitos de moradia e modo de vida preservados. Garante que as escolas estaduais incluirão em seu currículo o estudo da história e cultura indígena do Estado do RJ. Concomitantemente defende a implantação do modelo de saúde pública proposto pelos povos originários enquanto um subsistema do SUS, articulando-se com a SESAI – Subsecretaria Especial de Saúde Indígena – a nível federal e promovendo essa articulação com os municípios.
Considerações finais
Segundo a Rede de observatórios de segurança, 51,7% do quantitativo de pessoas que habitam o Estado do Rio de Janeiro é formado por pretos e pardos, no entanto, as necessidades dessa parcela são insistentemente negligenciadas pelo poder público. O mesmo levantamento denúncia que 86% dos mortos em ações policiais são negros, só no município do Rio de Janeiro, esse grupo representa 90% das vítimas[48].
A violência policial é um dos tentáculos do racismo que rege a necropolítica do Estado Por outro lado, há a insegurança alimentar que faz parte da vida de 2,7 milhões de cariocas e fluminenses, sendo afetados, majoritariamente, mulheres, pretos e pardos. Os últimos representam 37,6% dos que vivem com restrição ou passam fome[49]. O quadro se torna mais complexo quando analisada a porcentagem de desempregados no Rio de Janeiro, quase 70% são pretos ou pardos[50].
Com a extrema situação de vulnerabilidade experimentada pelo povo preto e pobre do Rio de Janeiro, se mostra essencial que o futuro governador(a) volte o seu olhar para questões ligadas às desigualdades étnico-raciais que compõem as estruturas do Estado. Mitigar os impactos do racismo é importante, porém, tão importante quanto é a construção proativa de uma realidade que possibilite o prosperar dessa parcela, investindo em políticas públicas que proporcionem segurança alimentar, saúde, empregabilidade, educação de qualidade e segurança pública.
[40] Laryssa Miranda é aluna do 7º período de Sociologia na UFF e pesquisadora do OPEL.
[41] https://bit.ly/mulheres-maioria-apta-a-votar
[42] https://bit.ly/escandalos-claudio-castro
[43] https://bit.ly/propostas-freixo
[45] https://bit.ly/proposta-juliete
[46] https://bit.ly/proposta-cyro
[47] https://bit.ly/proposta-eduardo