O Boletim #3 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No décimo segundo texto “Os candidatos, a gramática das redes sociais e o perigo das redes ‘alternativas'” (p. 70-75), a graduanda em Ciências Sociais Luísa Pinheiro (@antunesslu) tem por objetivo analisar o impacto do uso das mídias sociais na construção da estratégia das campanhas políticas.

Confira o texto abaixo!

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Os candidatos, a gramática das redes sociais e o perigo das redes “alternativas”
Luísa Antunes Pinheiro[124]

Resumo Como demonstrado no boletim que marcou o início desta pesquisa, as mídias digitais, aqui definidas como meios de comunicação da internet, vêm ocupando lugar central na organização das sociedades contemporâneas. Seu impacto nas eleições presidenciais de 2018 no Brasil indica os rumos das estratégias de comunicação dos candidatos às eleições de 2022. Ao passo que alguns estão aprendendo agora a construir uma narrativa que dialogue com a linguagem dos ambientes virtuais, candidatos como Bolsonaro têm buscado levar sua comunicação digital para plataformas mais periféricas. Este boletim tem por intuito se debruçar sobre essas dinâmicas a partir de matérias de revistas, programas jornalísticos, reportagens e afins.

Redes Sociais e a gramática da juventude

Após os impactos das mídias digitais nas eleições presidenciais de 2018, os personagens da política brasileira vêm se atentando cada vez mais para o uso dessas plataformas. Como foi apresentado no boletim de maio, a direita foi pioneira nesse quesito, e agora os candidatos mais à esquerda vêm também reformulando suas estratégias de comunicação[125]. As redes sociais possuem uma linguagem específica, da qual Bolsonaro soube se apropriar muito bem em 2018. Caracterizadas pela informalidade, elas dialogam principalmente com a juventude, que constitui a maior parte dos internautas. Por isso, em 2022 o cenário eleitoral é atravessado pela tentativa dos candidatos de construir uma narrativa a partir dessa gramática das redes.

A campanha de Lula, por exemplo, além de contar com as redes sociais do pré-candidato e com seu site[126], tem também outras frentes que dialogam ainda mais com essa perspectiva das dinâmicas das redes sociais. O portal Lulaverso[127], lançado em março, divulga conteúdos favoráveis ao ex-presidente com essa estética. Ele é recheado de memes, GIFs e figurinhas do Lula e do PT, além de também possuir perfis nas principais redes sociais, como WhatsApp, TikTok, Telegram, Twitter, Youtube e Instagram. O pedetista Ciro Gomes também vem utilizando as mídias digitais para se conectar principalmente com o eleitorado mais jovem. Com uma estratégia similar à utilizada por Guilherme Boulos nas eleições de 2020, o candidato está realizando uma série de programas nas redes que vão de encontro ao formato dos conteúdos mais consumidos pela juventude na internet: “Ciro Games”, uma live semanal realizada por Ciro com transmissão em diversas plataformas, e “React do Cirão”, vídeos em que ele reage a falas de autoridades ou políticos, são dois desses programas.

Em maio, essa atuação tomou uma proporção ainda maior com a repercussão do debate entre o pedetista e o humorista Gregório Duvivier transmitido ao vivo nas redes sociais do candidato. Com 170 mil posts no twitter apenas no dia seguinte da live, Ciro teve sucesso em levar seu nome para os debates em pauta nas redes[128]. Porém, recheado de interrupções de Ciro, além de falas extremamente acaloradas atacando Lula e o próprio Gregório e sua equipe, o resultado do debate não foi positivo para a rede do candidato. Afinal, a maior parte dos comentários eram de perfis apoiadores do Lula, que se lamentavam pelas falas de Ciro, e, em seguida, de apoiadores do Bolsonaro, que compartilharam os ataques de Ciro à Lula e ao PT, contudo, sem defender o pedetista.

A mobilização ao redor desse episódio exemplifica um outro elemento central da gramática das redes: os “influenciadores”, que são muitas vezes artistas, como Gregório Duvivier. No episódio do dia 30 de junho do podcast de cultura da Folha de São Paulo[129], o mestre em ciência da informação, Fábio Malini, que é também coordenador do Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cultura (LABIC/UFES), relata que coletou postagens nas redes relacionadas aos temas “lula, ciro, bolsonaro e outros pré candidatos” e observou que 37% desse conteúdo vinha de perfis ligados ao entretenimento. A conquista de espaço nos ambientes virtuais passa diretamente por essas figuras, inclusive na esfera política, fato que Bolsonaro parece conhecer há algum tempo. Logo após ganhar as eleições, divulgou em suas redes “excelentes opções de canal de informações”: uma lista de canais do Youtube que continha nomes como Olavo de Carvalho, Nando Moura e Diego Rox[130].

Além de se comunicar com seus eleitores através dessas figuras da internet alinhadas com o bolsonarismo, uma de suas estratégias nas redes também parece ser a de interagir com influenciadores que mobilizam muitos seguidores, mesmo aqueles que não o apoiam, como Anitta. O presidente e a cantora já trocaram farpas no Twitter a ponto de Anitta bloquear Bolsonaro na rede social e se pronunciar dizendo que reconhecia essa estratégia de marketing utilizada por ele, que consistiria em tentar cooptar seu engajamento para si[131]. Ricardo Salles, ex-ministro do meio ambiente, também discutiu com a cantora nas redes sociais após ela divulgar um ato contra a “PEC do Veneno”, que facilitaria o registro de agrotóxicos no Brasil[132].

Recentemente, Anitta voltou a gerar movimentações nas redes sociais relacionadas à política ao declarar voto em Lula após o assassinato do tesoureiro do PT por um bolsonarista[133]. Essa declaração, feita em seu twitter, com 17,8 milhões de seguidores [134], gerou uma série de repercussões na rede, que levaram Anitta a se pronunciar novamente para dizer que não é petista, e que não autoriza o uso de sua imagem pelo partido, pronunciamento que Bolsonaro rapidamente repostou em sua rede com emojis de mãos batendo palma, simulando aplausos. Mais uma vez, Bolsonaro se apropriou dos debates em pauta de modo que gerou mais engajamento do que Lula, que era o tópico inicial da fala de Anitta [135].

Desinformação e mídias alternativas

Apesar de Bolsonaro liderar as redes sociais em comparação com os outros candidatos[136], ele ainda estimula o contato com seus eleitores por plataformas menores. É uma movimentação muito curiosa, visto que ele não precisaria de outras redes para garantir um bom alcance. Entretanto, tudo indica que o estímulo de Bolsonaro à adesão de seus eleitores é revelador no que tange à forma como ele se comunica e às bases ideológicas que prega. A postura dessas mídias alternativas é muito atravessada pela defesa da liberdade de expressão de modo irrestrito, o que permitiria a Bolsonaro um ambiente em que pudesse fazer declarações que outras plataformas limitam.

O Telegram, conforme Darren Loucaides aponta em sua matéria na revista Piauí do mês de maio[137], passou a crescer ao passo que as “Big Techs”, como Google e Facebook, aumentaram suas políticas de moderação. Na reportagem em questão, um executivo sênior da empresa é entrevistado e suas falas elucidam a visão de dentro da organização da própria plataforma: “(…) somos a única plataforma independente onde não existe censura e onde você pode de fato expressar suas opiniões”.

As escolhas que o Telegram fez desde que foi criado vão ao encontro dessa fala, como por exemplo a de não cumprir com as medidas que o governo alemão impunha às empresas de mídias digitais, o que acarretou em um processo do governo contra o Telegram. No Brasil, a plataforma também gerou ruídos com o governo ao não atender à decisão judicial de bloqueio de perfis apontados como disseminadores de informações falsas, incluindo o blogueiro bolsonarista Allan dos Santos[138]. Apenas após a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) de bloquear o aplicativo, o Telegram cooperou e aderiu também ao Programa Permanente de Enfrentamento à Desinformação no Âmbito da Justiça Eleitoral criado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e assinado meses antes por diversas plataformas digitais, como Twitter, Facebook, TikTok e WhatsApp[139].

A migração da extrema direita para plataformas alternativas tem sido comum ao redor de todo o mundo, desde negacionistas da pandemia do Covid-19 até figuras da extrema-direita norte-americana que incentivaram seus seguidores a usar o Telegram. A plataforma inclusive teve um crescimento significativo após a invasão do Capitólio nos Estados Unidos em janeiro de 2021. Apesar da justiça brasileira parecer estar observando com cautela essas movimentações, a fim de garantir a proteção da democracia e o combate às fake news, sua atuação com relação a uma dessas mídias parece contradizer esses pilares. A rede social Gettr, que foi lançada pelo porta-voz de Trump, Jason Miller, após o banimento do ex-presidente de outras redes por incentivar a invasão ao Capitólio, virou mais um portal da extrema-direita recém-chegado ao Brasil. Porém, não sofreu pressão do STF para assinar o acordo de combate às fake news que as outras plataformas firmaram[140]. A programação da rede, em sua busca pela consolidação no Brasil, contou com lives diárias com figuras bolsonaristas, como Allan dos Santos, o blogueiro citado anteriormente no caso de bloqueio do Telegram no Brasil. Em uma notícia publicada no Gettr em julho de 2022, a empresa destaca o crescimento da plataforma como nunca antes visto em comparação com as outras redes sociais, e trechos de um artigo de Miller criticam o Twitter como uma rede fadada ao fracasso que coloca “acordar acima da liberdade”[141].

Conclusão

No cenário do Brasil em 2022, as mídias digitais ainda funcionam como uma incógnita em seu impacto no processo eleitoral, visto que o ambiente digital é extremamente dinâmico e ainda muito desconhecido por diversos candidatos. Em comparação a 2018, neste momento existe uma atenção muito maior às fake news. Porém, com alternativas como Gettr e Telegram, que parecem fazer vista grossa para esse tipo de conteúdo em suas plataformas, somadas a um aparente descaso da justiça brasileira, esse controle é dificultado, o que prejudica que a corrida eleitoral ocorra de forma íntegra. Os próximos boletins seguirão se debruçando sobre essas movimentações, no intuito de analisar o impacto das mídias, tanto digitais quanto tradicionais, nas eleições de 2022.

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[124] Graduanda em Ciências Sociais na UFRJ e Pesquisadora do Observatório Político Eleitoral (Opel).

[125] https://observatoriodoconhecimento.org.br/o-impacto-das-midias-no-cenario-eleitoral-brasileiro-por-luisa-antunes/

[126] https://lula.com.br/noticias/

[127] https://lulaverso.com/

[128] https://twitter.com/pbruzzi/status/1528039794370027522?s=20&t=5LNiCVBJ7bYdxG2tmsoCCA

[129] https://open.spotify.com/episode/5GhdS0G21OUVRS2Akf4ocN?si=7QPY15wbS3SvUGhJzTaRpQ

[130] https://twitter.com/jairbolsonaro/status/1061809199196368896

[131] https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/04/5001149-anitta-bloqueia-bolsonaro-no-twitter-apos-interacao-ironica-do-presidente.html

[132] https://www.uai.com.br/app/noticia/famosos/2022/02/23/interna-famosos,283973/anitta-discute-com-ex-ministro-de-bolsonaro-nao-vale-falar-do-meu-c.shtml

[133] https://g1.globo.com/pop-arte/musica/noticia/2022/07/11/anitta-repudia-ataque-a-tesoureiro-do-pt-e-declara-voto-em-lula.ghtml

[134] Consulta feita em 26 de julho de 2022 às 10:17.

[135] https://www.opovo.com.br/eleicoes-2022/2022/07/21/apos-fala-de-anitta-bolsonaro-teve-mais-engajamento-nas-redes-sociais-do-que-lula.html

[136] http://Consulta feita em 26 de julho de 2022 às 10:17.

[137] LOUCAIDES, Darren. “Por dentro do Telegram”. Piauí, edição 188, p. 22 – 32, maio/2022.

[138] https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/03/4994137-ministro-alexandre-de-moraes-ordena-bloqueio-do-telegram-no-brasil.html

[139] https://www.infomoney.com.br/minhas-financas/apos-determinacao-de-bloqueio-pelo-stf-telegram-assina-acordo-de-adesao-a-programa-do-tse/

[140] https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painel/2022/06/em-expansao-no-brasil-rede-usada-por-bolsonaristas-fica-fora-do-radar-do-tse.shtml

[141] https://about.gettr.com/press/post-musk-twitter-is-doomed-disruptive-social-media-platforms-will-replace-it-gettr-ceo-jason-miller

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