Participação das mulheres nas eleições: histórico e novidades, por Carolina Tostes
O Boletim #3 está no mundo!
Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?
No sexto texto “Participação das mulheres nas eleições: histórico e novidades” (p. 31-37), a graduanda em Ciências Sociais Carolina Tostes analisa o histórico de mudanças eleitorais que abriram mais espaço para candidaturas de mulheres nos mais diversos espaços políticos e sua expressão no sistema eleitoral.
Confira o texto abaixo!
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Participação das mulheres nas eleições: histórico e novidades
Carolina Tostes [38]
Resumo O presente texto é parte da pesquisa do Projeto de Monitoramento Eleitoral 2022 e tem por objetivo analisar o histórico de mudanças eleitorais que abriram mais espaço para candidaturas de mulheres nos mais diversos espaços políticos e sua expressão no sistema eleitoral. Para isso, nesse terceiro boletim, serão levantados nomes importantes que já disputaram e/ou ocuparam cargos importantes, além das atuais candidaturas para as eleições de outubro deste ano. O texto irá se debruçar sobre a relação dessas mulheres com seus partidos, movimentos sociais e com suas próprias ideias e posicionamentos, sendo usado como material para a construção dessa argumentação matérias de jornais, entrevistas e declarações públicas das citadas.
Mudanças eleitorais: tentativas de abrir espaço
O Brasil é marcado pela presença majoritária de homens nos espaços de decisão política. Traçando-se o histórico de candidatas a cargos legislativos (deputadas e senadoras) ou executivos (governadoras, prefeitas e presidentas), é notável a escassa presença dessas personagens. A partir desse cenário, a legislação eleitoral tem sido modificada na intenção de incentivar a participação feminina nos processos políticos do país. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 18/2021 cria novas regras na distribuição de fundos de campanha, estipulando a aplicação de um mínimo de 30% dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha para as candidaturas proporcionais femininas[39].39
Porém, a PEC também propõe anistia aos partidos que não cumprirem a cota mínima de recursos por gênero e etnia, permitindo assim maior arbitrariedade nessa escolha. Apesar de ser um avanço, o fato de a presença feminina precisar de tantos esforços para receber alguma atenção dos próprios partidos, é um sintoma do entendimento de que a política não é um lugar que pertence às mulheres.
Presidenta com “a” e o machismo no impeachment
A presidenta Dilma Rousseff foi eleita para seu primeiro mandato em 2010, após disputar o segundo turno com José Serra e sair vitoriosa com 56% dos votos, tornando-se a primeira mulher presidenta do Brasil. Em 2014, foi eleita para um segundo mandato conturbado, que culminou na protocolização de seu impeachment em 2016. Apesar das disputas políticas e contradições em torno do governo, o papel do machismo nas acusações contra Dilma é um tema levantado por diversos pesquisadores, entendendo a imagem de uma mulher como chefe de Estado, nesse caso, presidenta da República, como uma afronta à ordem estabelecida majoritariamente composta por homens.
Com isso, a representação da presidenta como descontrolada pela mídia, além do uso de sua imagem como forma de piada ou com alusões sexuais eram comuns nos meses que presidiram sua derrubada. A partir do levantamento do jornal Brasil de Fato, em entrevista com a pesquisadora Perla Haydee da Silva, autora de um livro sobre o tema, os principais eixos de perseguição eram o da capacidade mental e intelectual, chamando de burra ou louca, a da vida sexual, com termos como “prostituta” e de xingamentos como nojenta[40].
O Ministério do presidente interino Michel Temer, vice de Dilma e grande articulador do golpe, passou por um momento sendo composto apenas por homens brancos, reafirmando o entendimento de quem estava sendo representado na forma de fazer política ali defendida[41].
Nomes históricos que se mantém atuais
Diferente de grande parte das candidatas que hoje apoiam e compõem o governo Bolsonaro e surgiram na cena pública nos últimos anos, o campo da esquerda possui nomes históricos como o de Benedita da Silva (PT) e Luiza Erundina (PSOL), que permanecem ativas e atuais mesmo com seus 80 e 87 anos, respectivamente. Atualmente ocupando cargos de deputadas federais, ambas já passaram por cargos institucionais inéditos ou pouco ocupados por mulheres.
Benedita em 1992 foi candidata à prefeitura do Rio de Janeiro, sendo derrotada no segundo turno por César Maia. Porém, em 1998, foi eleita vice-governadora na chapa com Anthony Garotinho, em que, devido à renúncia para concorrer à presidência, fez com que ela ocupasse o cargo de governadora durante 8 meses. Depois desse curto mandato, tentou novamente eleição à prefeitura do Rio mas foi derrotada por Rosinha Garotinho, eleita com grande número de votos. Benedita passou por cargos de ministra e secretária entre 2003 e 2007, e em 2010 foi eleita novamente deputada federal, renovando seu mandato em 2014 e 2018. Ela foi a primeira senadora negra do Brasil, além de sempre manter laços com movimentos sociais e de favela.
Luiza Erundina, atualmente deputada pelo PSOL, foi prefeita de São Paulo pelo PT em 1988, obtendo uma vitória surpreendente na época. Com um mandato elogiado até hoje, Erundina implementou mudanças em sua gestão, principalmente na área da educação, com apoio de Paulo Freire, e em debates sobre a questão habitacional na cidade. Ela migrou para o PSB, sendo eleita deputada federal em 1999, renovando os mandatos em 2002 e 2006. Em meio a outros cargos e circulação política, filiou-se ao PSOL em 2016. Foi candidata à prefeitura como vice de Guilherme Boulos, companheiro de partido, em 2020. A chapa chegou ao segundo turno, concorrendo com o atual prefeito que tentava sua reeleição, Bruno Covas (PSDB). A disputa terminou com a eleição de Covas, com 59%, enquanto a chapa psolista recebeu 40%.
Atuais candidaturas: quem representa e o que expressam
Para as eleições de Outubro deste ano, alguns nomes importantes já estão sendo anunciados para disputar vagas nas diferentes esferas institucionais. Tanto o campo da esquerda quanto o da direita têm apostado em candidatas mulheres, com o entendimento de que, representando 51% da população brasileira, mesmo a partir de diferentes opiniões, o eleitorado feminino é um grande definidor do apoio ou rejeição para definir o rumo das eleições.
A ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, estava sendo cotada como candidata ao senado do Distrito Federal pelo partido Republicanos, do qual faz parte. Porém, depois de movimentações do Presidente e acordos fechados com outros partidos, Damares foi substituída pela também ex-ministra Flávia Arruda (PL), que lidera as pesquisas de intenção de votos com 29%[42]. Outros nomes como Carla Zambelli (PL) e Bia Kicis (PL), atuais deputadas federais, ainda não começaram suas campanhas para tentativa de reeleição.
Janaina Paschoal (PRTB) mantém-se firme na sua candidatura ao senado de São Paulo. A deputada estadual, eleita com 2 milhões de votos em 2018, diz estar recebendo pressão por todos os lados para retirar seu nome da disputa[43]. Janaina mantém o seu discurso de eficiência, reafirmando sua competência para o cargo com uma linha de neutralidade sobre seu trabalho nos últimos anos em relação a outros vínculos políticos. A jurista escreveu em seu Twitter que “muitos estão pensando no Senado ideal para a hipótese de vitória de Bolsonaro. Eu quero um Senado forte, especialmente para o caso de vitória de Lula”[44]. É importante lembrar que ela foi uma das responsáveis pela protocolização do impeachment da presidenta Dilma Rousseff em 2016 e tem se colocado como uma opositora ferrenha do Partido dos Trabalhadores.
No Rio Grande do Norte, o PT oficializou a candidatura de Fátima Bezerra ao governo do estado, o vice da chapa será Walter Alves, do MDB[45]. A atual governadora tem uma longa trajetória política, já tendo ocupado os cargos de deputada estadual, deputada federal e senadora. Também no Nordeste, a deputada federal de Pernambuco Marília Arraes, eleita pelo PT em 2018 e atualmente do Solidariedade, é candidata a governadora causando indisposição com seu antigo partido, já que o candidato do mesmo é Danilo Cabral (PSB). Porém, no estado, a corrida tem se expandido entre duas mulheres: Marília, considerando a margem de erro, está empatada com Raquel Lyra (PSDB)[46] na disputa. A primeira ganharia em um cenário de segundo turno.
Chapas presidenciais e as mulheres
A convenção do Partido Liberal (PL), no Rio de Janeiro, confirmou no domingo (dia 24/07) o general da reserva e ex-ministro Braga Netto como vice do atual presidente Jair Bolsonaro[47]. A chapa será pura, ou seja, com ambos os integrantes do mesmo partido. O nome de Tereza Cristina (Progressistas) chegou a ser cotado para o cargo, mas a ex-ministra da Agricultura segue na disputa ao senado pelo Mato Grosso do Sul, sendo considerada líder isolada nas pesquisas.
Com esse cenário, a disputa dos presidenciáveis se concretiza com figuras masculinas. Tanto a chapa de Lula, ao lado de Geraldo Alckmin (PSB), quanto a de Bolsonaro, é composta por homens brancos e com histórico de vida política. Ciro Gomes, que aparece em terceiro lugar nas pesquisas com 8% das intenções de votos, ainda não tem seu vice consolidado. Segundo o Datafolha divulgado dia 23, Simone Tebet (MDB) segue com 2%. Vera Lúcia (PSTU) aparece com 1% e Sofia Manzano (PCB) não pontuou[48].
Em 2018, apesar da disputa também ter sido entre dois homens, o esforço para terem vices mulheres em suas chapas foi demonstrado por partidos no campo da esquerda, do centro e da direita. Fernando Haddad (PT) e Manuela Dávila (PCdoB), Ciro Gomes (PDT) e Kátia Abreu (Progressistas), Geraldo Alckmin (PSB) e Ana Amélia (PSD), Guilherme Boulos (PSOL) e Sônia Guajajara (PSOL) são alguns dos exemplos. Além disso, Marina Silva (REDE) é um nome antigo da política brasileiro, já tendo sido deputada, senadora e ministra, mas não teve expressão em suas candidaturas à Presidência em 2010, 2014 e 2018, obtendo apenas 1% dos votos na última. Marina foi convidada para participar da chapa de Fernando Haddad (PT) como vice-governadora em São Paulo, mas recusou em prol de sua candidatura à deputada federal pelo estado[49].
O que esperar para outubro
Dessa forma, o cenário que se expõe para as eleições de outubro demonstra o reposicionamento e movimentação de nomes consolidados, permitindo pouco espaço para pessoas novas, ao contrário de 2018. Na eleição daquele ano, diversas figuras “surfaram” na onda da candidatura do atual presidente Jair Bolsonaro, e na imersão de sentimentos como patriotismo, anticorrupção e anticomunismo. Assim, os próximos 3 meses expressa um clima acirrado dentro dos próprios partidos e campos ideológicos devido às alianças, coligações e relações entre candidatos.
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[38] Carolina Tostes é graduanda de Ciências Sociais na UFRJ e pesquisadora do NUDEB/IFCS.
[39] “Regras beneficiando mulheres na política serão incluídas na Constituição”. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/03/31/regras-beneficiando-mulheres-na-politica-serao-incluidas-na-constituicao
[41] https://www.bbc.com/portuguese/brasil/2016/05/160511_aliados_temer_ms_cc
[44] https://twitter.com/JanainaDoBrasil/status/1550925581193297921