O Boletim #3 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No quarto texto “Polarização: lados opostos da mesma moeda?” (p. 22-26), a graduanda em História Isabelle Braga apresenta os usos do conceito polarização na conjuntura brasileira contemporânea, a partir da análise das pré-candidaturas de Lula e Bolsonaro à Presidência da República, e a contribuição da mídia na massificação dessa palavra no país.

Confira o texto abaixo!

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Polarização: lados opostos da mesma moeda?
Isabelle Braga [21]

Resumo O presente texto tem por objetivo apresentar os usos do conceito polarização na conjuntura brasileira contemporânea, a partir da análise das pré-candidaturas de Lula e Bolsonaro à Presidência da República, e a contribuição da mídia na massificação dessa palavra no país. Para isto, neste terceiro boletim, usamos como base o artigo do Rodrigo Nunes, “Todo lado tem dois lados”, publicado na Revista Serrote, em março de 2020 e analisamos durante o período de dois meses (18 de maio de 2022 a 18 de julho de 2022) os editoriais publicados pelo Jornal O Globo, mais influente mídia impressa do Estado do Rio de Janeiro. O objetivo é compreender os contextos e significados do conceito.

Polarização: origem do conceito e importação para o Brasil

O surgimento do conceito de polarização é datado na década de 80 nos Estados Unidos. Em 1984, os cientistas políticos Keith T. Poole e Howard Rosenthal escreveram que as eleições no país norte-americano estavam cada vez mais disputadas entre “duas coalizões opostas, a liberal e a conservadora, ambas com posições relativamente extremas”.22 Dessa forma, quem se encontrava com dificuldade de ser representado eram os eleitores “nem lá nem cá”, que não se viam contemplados nem pelos liberais e nem pelos conservadores pois buscavam a moderação em prol de evitar mudanças bruscas.

Já em 2006, Poole e Rosenthal se juntam a Nolan McCarty para escrever o livro Polarized America: The Dance of Ideology and Unequal Riches no qual apresentam três critérios para identificar a polarização: a redução da política a dois campos, o liberal e o conservador; o desaparecimento progressivo de posições intermediárias; e a associação desses campos a cada um dos partidos que dominam o sistema político norte-americano (o Democrata e o Republicano).

O retorno desses pontos reaparece durante o governo de Barack Obama (2009-2016), um centrista convicto, que encontrava dificuldades no Congresso para negociar propostas, uma vez que, existia uma oposição republicana que não estava disposta a mediações dado ao aliamento com o Tea Party, movimento com abundante financiamento corporativo, que cobrava de seus representantes posições cada vez mais à direita. Assim, o substantivo “polarização” ganha um peso importante: a ideia de “assimetria”. Não era somente a distância entre liberais e conservadores que estava crescendo, mas esse fato era dado pela radicalização do campo conservador que deixava a responsabilidade para os liberais de se comprometer com agendas do campo democrático.

No Brasil, o conceito passa a ser mais frequentemente utilizado na conjuntura pós-junho de 2013, como forma de interpretar o processo de crise democrática, iniciado alguns anos antes, que culminou na existência de uma nova direita mais radical e organizada. Em uma entrevista de 2014, Paulo Arante sinalizou a formação de um campo político “que não está mais interessado em governar”, pelo menos não para a maioria e que por isso podiam “se dar ao luxo de ter posições nítidas e inegociáveis”.

Jornal O GLOBO e polarização

No recorte do período de 2 meses que foi analisado, encontramos apenas um editorial que abordasse a polarização23. O assunto tratado foi o assasinato do petista Marcelo Aloizio de Arruda pelo bolsonarista e policial Jorge Guaranho, em Foz do Iguaçu (PR), que foi morto a tiros em sua festa de aniversário no qual tinha o tema do PT. Esse fato ocorre depois de ataques a um evento, que contava com a presença de Lula, em Uberlândia (MG), acontecimento que se repetiu no mês seguinte no comício do Rio de Janeiro onde houve uma explosão de bomba caseira também com fezes.

Vale lembrar que em 2018 o mestre de capoeira Moa de Katendê também foi assassinado a facadas por bolsonarista após declarar voto a Fernando Haddad (PT). Essa incidência reforça o caso da radicalização do campo conservador, que no governo Bolsonaro viu seu acesso a armas cada vez mais facilitado e incentivado.

Os canais de notícias possuem papel fundamental na construção dessa ideia de polarização e de quem ocupa os polos. Como Nunes pontuou no artigo: “O reflexo jornalístico de ‘contar os dois lados da história’ mesmo quando as declarações de um lado não têm nenhum lastro na realidade faz com que os veículos ajudem manipuladores a criar uma falsa aparência de simetria que é instrumental para quem se alimenta da polarização.”24. Junto com a nova norma de busca desesperada por cliques, declarações extremas ajudam na consolidação de figuras polêmicas e no aprofundamento da polarização.

Lula x Bolsonaro: um caso de polarização

Na atual conjuntura brasileira, na qual iremos enfrentar uma das eleições mais importantes desde o processo de redemocratização do país, a polarização é algo concreto. Na última pesquisa publicada pelo Datafolha, Lula possui 47% das intenções de votos contra 29% de Bolsonaro25. Com a possibilidade de ser derrotado pelo petista, Bolsonaro infla a sua base para orquestrar um golpe. Dessa forma, ninguém – a não ser os bolsonaristas – possuem dúvidas de que quem de fato ocupa um dos extremos é a extrema direita. Em relação ao outro lado existem diversas vertentes, entendendo que a esquerda é um campo diverso, porém, para a extrema direita qualquer um que mostre afeição por pautas sociais automaticamente são classificados como esquerda.

É importante pontuar que existem duas concepções de polarização, a simétrica, a partir de uma operação retórica onde alguns agentes simetrizam os dois polos como igualmente extremos e a assimétrica, ou seja, os polos não são equivalentes26. No primeiro caso os lados assumem a posição de serem a única alternativa ao lado oposto. Já no segundo caso, que é o visto no cenário eleitoral brasileiro, um dos lados, geralmente a extrema direita, assume posições extremas a fim de atrair para sua direção o centro do debate e jogar para o outro lado toda a responsabilidade para negociar compromissos27, visto que, a extrema direita abertamente coloca que não pretende governar para todos. Ela somente deseja consolidar uma base radicalizada, capaz de manter sua força eleitoral. Hoje representada pelo Bolsonaro e o Bolsonarismo.

Conclusão

Ao longo do tempo a noção de polarização se tornou algo tão abrangente que muitos se perguntam se ela de fato explica alguma coisa, porém é inegável que ela parece captar elementos importantes do nosso tempo. O interesse é que a ideia de polarização adquiriu é obviamente derivado das consequências práticas que ela pode ter28. Nas eleições que estão por vir, o conceito volta a debate quando temos dois candidatos que expressam programas e culturas políticas distintas mais cotados para assumir a cadeira presidencial. Entender o conceito e perceber que no contexto que presenciamos a polarização não é simétrica é fundamental para distinguir qual projeto de país estamos dispostos a viver. A polarização se enraíza também pela construção de narrativa dos jornais de maior influência que disputam e formam a consciência coletiva sobre os rumos do país. Não nos restam dúvidas, assim, que a polarização posta é entre a democracia ou a barbárie.

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[21] Graduanda em História na UFF e pesquisadora no NUBED/UFRJ.

[22] Keith T. Poole e Howard Rosenthal, “The Polarization of American Politics”, The Journal of Politics. Chicago, v. 46, n. 4, nov. 1984, p. 1.061.

[23] https://oglobo.globo.com/opiniao/editorial/coluna/2022/07/e-urgente-deter-escalada-de-violencia-na-arena-politica.ghtml

[24] https://www.revistaserrote.com.br/2020/06/todo-lado-tem-dois-lados-por-rodrigo-nunes/

[25] https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2022/07/28/interna_politica,1383183/datafolha-lula-tem-47-bolsonaro-29.shtml?_gl=1*1gib82c*_ga*WEtuOGppT0NjWUdNcjZqYUpheEh2Sms5VWd6OHlnSHV6dzBWRkJfQ0NaR2haaFMyQmU1dUpSaEFqeUNzQ0JLRA

[26] https://www.revistaserrote.com.br/2020/06/todo-lado-tem-dois-lados-por-rodrigo-nunes/

[27] https://www.revistaserrote.com.br/2020/06/todo-lado-tem-dois-lados-por-rodrigo-nunes/

[28] https://www.revistaserrote.com.br/2020/06/todo-lado-tem-dois-lados-por-rodrigo-nunes/

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