O Boletim #2 está no mundo!

Que tal conferir um pouco mais das temáticas abordadas?

No décimo segundo texto “A campanha bolsonarista na mídia tradicional” (p. 77-82), a graduanda em Ciências Sociais Luísa Pinheiro analisa as dinâmicas que a campanha bolsonarista vem construindo com as mídias tradicionais.

Confira o texto abaixo!

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A campanha bolsonarista na mídia tradicional
Luísa Antunes Pinheiro [197]

Resumo O presente texto faz parte da pesquisa do Observatório Político Eleitoral de monitoramento das eleições de 2022 no Brasil. Com as mídias como tema central, após o panorama histórico traçado no primeiro boletim, nesta edição serão analisadas as dinâmicas que a campanha bolsonarista vem construindo com as mídias tradicionais[198]. Apesar da relevância das mídias digitais[199] no processo eleitoral, principalmente após 2018 com Bolsonaro, neste momento sua campanha parece estar estabelecendo uma nova relação com as mídias tradicionais. Por isso, o boletim deste mês tem por intenção se debruçar sobre essa relação, pensando em suas viradas de 2018 até o presente momento. Para tal estudo, foram utilizadas matérias de revistas, programas jornalísticos, reportagens e afins.

A ausência de Lula e Bolsonaro dos debates televisivos

Lula e Bolsonaro, os dois pré-candidatos com mais altas intenções de voto nas pesquisas realizadas até então[200], parecem não estar dispostos a ir aos debates eleitorais do primeiro turno das eleições de 2022[201] . Bolsonaro argumenta que será alvo de “pancadas”, já que os debates irão focar no desempenho de seu governo nesses quatro anos de atuação, e Lula condicionou sua presença à presença do atual presidente, declarando que, se Bolsonaro não for, ele também não irá. O ex-presidente reconhece a importância dos debates, porém sua campanha propõe uma mudança no modelo vigente. A queixa diz respeito à quantidade de debates que acontecem, na medida em que acabam tomando um grande espaço na agenda dos candidatos que se propõem a comparecer. Por isso, a alternativa proposta, inspirada nos debates estadunidenses, é o modelo pool, que reúne diversos veículos de comunicação em dois ou três debates com ampla difusão. Bolsonaro, por sua vez, também sugere uma mudança na dinâmica dos debates: que as perguntas sejam pré-acertadas, para não “abaixar o nível”[202] .

No episódio do dia dois de Junho do podcast Café da Manhã do jornal Folha de São Paulo203, o cientista político Fábio Vasconcelos demonstra mais uma possível explicação para tais decisões dos pré-candidatos. Ele relata que percebeu um dado interessante em sua pesquisa: os eleitores que mais assistem aos debates televisivos são aqueles que já sabem em quem vão votar, em seguida os que vão votar branco ou nulo e, por último, os indecisos. Esse último grupo é o mais interessante, no que tange a campanha, para candidatos como Lula e Bolsonaro, que já possuem um eleitorado sólido. Como o foco das campanhas vai ser manter as bases e atingir esses eleitores indecisos, a ida aos debates pode não só não garantir votos, como prejudicá-los. Por isso, essas duas figuras vêm buscando outras maneiras de levar sua imagem para potenciais eleitores.

A instrumentalização da TV Brasil como parte da campanha eleitoral de Bolsonaro

Bolsonaro, que em 2018 fez sua campanha massivamente nas mídias digitais, ao passo que atacava os veículos de comunicação tradicional, mudou sua postura frente a uma dessas mídias depois do início de seu mandato. O canal televisivo TV Brasil, que ele prometia fechar ou vender com o argumento de que seu propósito era fazer propaganda petista, acabou sendo utilizado justamente para fins de promoção, mas nesse caso, do governo Bolsonaro. Na edição de maio de 2022 da revista Piauí, Luigi Mazza demonstra como a TV Brasil se transformou na emissora de Bolsonaro[204]. A TV Brasil e a empresa da qual faz parte, a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), surgem em 2007 como uma resposta do governo Lula às demandas por um sistema de comunicação pública no Brasil. O intuito da empresa era garantir uma programação e um editorial independentes do apelo comercial, do qual a mídia tradicional é submetida, e da influência do governo. Inspirada na BBC Inglesa, a empresa possuía estruturas que objetivavam garantir tal autonomia. Mazza traz análises de especialistas e opiniões de trabalhadores da emissora que afirmam que, por diversos fatores, a TV Brasil ainda estava em vias de alcançar sua total autonomia. Um deles é apontado por Murilo Ramos[205]: a TV Brasil divide seu espaço físico com a NBR, emissora que tem realmente como função fazer publicidade das ações do Poder Executivo.

Entretanto, o processo da emissora de alcançar esse objetivo começa a ser dificultado em 2016, quando Temer, recém-chegado à presidência, passa por cima de uma dessas leis, demitindo o então presidente da EBC. A decisão é interpretada pelo autor da matéria como uma vingança de Temer pela cobertura da emissora frente ao impeachment. Ao fim de seu mandato, a EBC havia sofrido transformações, impostas por uma medida provisória, que desmontaram as estruturas pensadas para garantir a autonomia da empresa. O mandato de quatro anos do presidente da empresa foi extinguido, bem como o Conselho Curador, que, formado por vinte e duas pessoas, sendo a maioria da sociedade civil, era peça fundamental para o controle da qualidade da programação da EBC.

Apesar de em 2016 os mecanismos democráticos da empresa de comunicação terem sido desmontados, funcionárias da EBC relatam que nada se compara a ruptura que aconteceu em 2019. “Acho que, nos governos anteriores, a gente chegou a alcançar 80% da autonomia que sempre sonhamos ter na EBC. Hoje estamos com 10%” conta Oliveira, repórter da TV Brasil desde 2008. Em abril de 2019, Bolsonaro funde informalmente a TV Brasil com a NBR, que passou a se chamar TV Brasil 2. Os conteúdos de propaganda das ações do governo realizados pela antiga NBR passaram a transbordar para a TV Brasil. Com diversas interrupções sem explicação na programação da emissora, aparições de Bolsonaro se tornaram extremamente frequentes: Mazza destaca que, entre agosto de 2020 e julho de 2021, elas corresponderam a um número de horas equivalentes à exibição de uma novela e meia da Globo, contabilizando, no total, 158 horas. Ainda que a audiência da TV não se compare com a da Rede Globo, o autor argumenta que, para um presidente em campanha eleitoral, seu número não é desprezível. Em janeiro deste ano, por exemplo, cerca de 18 milhões de brasileiros assistiram à emissora em algum momento[206].

A TV Brasil, que se tornou veículo de Bolsonaro, atuou na pandemia de modo similar aos grupos de WhatsApp que circularam informações falsas sobre o vírus e suas estratégias de combate. Porém, ela só entrou no radar do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em julho de 2021 em um episódio em que a emissora transmitiu uma live de duas horas do presidente denunciando uma suposta fraude nas urnas eletrônicas. Após esse episódio, o canal televisivo deixou de transmitir esses eventos na íntegra. Entretanto, a mensagem que fica é a de que a EBC continua sendo instrumento ilegal da campanha eleitoral bolsonarista – fator que apenas aprofunda a crise democrática que o Brasil vive na atualidade.

2022: O bolsonarismo com outra face

Além da TV Brasil, a Jovem Pan também atuou como um veículo de comunicação alinhado com o bolsonarismo. A rede, que cresceu significativamente após a eleição de Bolsonaro, é marcada por sua exaltação ao presidente e pela disseminação de Fake News, principalmente no que tange ao conteúdo sobre a pandemia. Figuras emblemáticas do bolsonarismo que foram demitidas da CNN por fake news ou por fazer comentários intolerantes, como Caio Coppola, Leandro Narloch e Alexandre Garcia, foram recebidas pela Jovem Pan com direito a posições de destaque e comemorações do dono da empresa[207].

Entretanto, a postura da emissora parece outra neste momento. Em maio deste ano, foi divulgado um editorial com o título “Compromisso com a democracia”, no qual a empresa afirma que, nesse período eleitoral que se aproxima, “não há espaço para descredibilizar o processo eleitoral com falácia” e “Qualquer manifestação a esses princípios não tem e não terá o apoio do grupo Jovem Pan”[208]. O apoio a Bolsonaro sem ressalvas não parece mais estar em jogo nessas eleições. Datena, pré-candidato ao senado e apresentador da TV Bandeirantes, também muito alinhada com as pautas bolsonaristas, sempre foi uma figura que endossou os discursos de Bolsonaro. Apesar de seu apoio, ele manifestou nos últimos dias sua insatisfação com os ataques de Bolsonaro à imprensa[209].

Essas mudanças demonstram as possíveis viradas do bolsonarismo em 2022. Os ataques às mídias tradicionais não parecem mais tão vantajosos da forma como foram anteriormente, visto que agora a posição de Bolsonaro no xadrez eleitoral é outra. Voltando à disputa com altos índices de rejeição, a campanha terá como um de seus objetivos furar a bolha através da mídia tradicional[210] . Os dois filhos do presidente, Carlos e Flávio, representam esses dois eixos comunicativos da máquina bolsonarista em 2022. Carlos, que foi um dos maiores articuladores da estratégia de comunicação do pai em 2018, segue controlando suas redes sociais, porém, Flávio agora entra para representar uma nova face: a comunicação institucional. Em uma virada marcante, pois a campanha de 2018 se construiu com diversos ataques à imprensa, em 2022 ela contará inclusive com um porta-voz da equipe de Bolsonaro para dialogar com os veículos de comunicação. O investimento no horário eleitoral também será diferente, visto que antes contou com apenas oito segundos de exibição em cada bloco e agora contará com cerca de três minutos.

Conclusão

As mídias digitais, que foram grandes ferramentas para a eleição de Bolsonaro em 2018, agora parecem não mais sustentar seu eleitorado da mesma forma. Com a presença de Lula na corrida eleitoral, além das opiniões formadas pela população após os últimos anos de Bolsonaro na presidência e de um aparente recuo dos grandes veículos em relação ao apoio a ele, a dinâmica das redes fomentada por seu filho Carlos não será a única aposta da campanha. A mobilização das mídias tradicionais mais alinhadas a Bolsonaro, como a TV Brasil, a Jovem Pan e a TV Bandeirantes, parece repetir alguns padrões vistos nas redes, como o das Fake News. Entretanto, é interessante analisar esses movimentos que parecem indicar que o apoio agora é condicional, e não mais irrestrito como já foi. Os próximos boletins terão por intuito seguir se debruçando sobre essas relações, observando as dinâmicas que serão construídas por esses agentes.

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[197] Graduanda de Ciências Sociais na UFRJ e pesquisadora do Observatório Político Eleitoral (OPEL).

[198] Meios de comunicação de jornalismo de referência, ou seja, organizações jornalísticas profissionais que alcançam um grande número de pessoas e que, originalmente, não são digitais. Podem ser jornais impressos, rádio, TV, revistas e etc.

[199] Meios de comunicação da internet, como blogs, redes sociais, sites, podcasts e etc.

[200] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/06/datafolha-lula-tem-19-pontos-sobre-bolsonaro-no-1o-turno.shtml

[201] https://www.cnnbrasil.com.br/politica/na-frente-nas-pesquisas-bolsonaro-e-lula-nao-devem-ir-a-debates-no-1o-turno/

[202] https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2022/noticia/2022/05/31/bolsonaro-defende-debates-com-perguntas-combinadas-e-confirma-presenca-so-no-2o-turno.ghtml

[203] https://open.spotify.com/episode/4Q2e3HnyiZAopYlW9nmkfE?si=696a53fb499a4b2c

[204] MAZZA, Luigi. “IRRUUUU!!”: Como Bolsonaro transformou a TV Brasil na sua emissora”. Piauí, edição 188, p. 14 – 21, maio/2022.

[205] Professor da Universidade de Brasília (UNB) e especialista em políticas de regulação de mídia.

[206] Dados do Kantar Ibope Media apresentados na matéria da Revista Piauí em questão.

[207] https://theintercept.com/2021/11/13/jovem-pan-puxadinho-demitidos-cnn/

[208] https://theintercept.com/2021/11/13/jovem-pan-puxadinho-demitidos-cnn/

[209] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/06/aliado-de-bolsonaro-datena-se-diz-desconfortavel-com-ataques-do-presidente-a-imprensa.shtml

[210] https://www.cartacapital.com.br/politica/carlos-e-flavio-disputam-poder-na-comunicacao-da-pre-campanha-de-bolsonaro/

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